Minhas poesias e seus porquês
Víctor Evangelista
2a edição
2021 Editora Itapuca Niterói – RJ
Copyright © by Víctor Evangelista. Todos os direitos desta edição reservados ao autor. Nenhuma parte desta obra pode ser usada em fotocópia, gravação ou meio eletrônico sem autorização do autor, exceto nos casos de resenhas e artigos literários.
Preparação de Texto Editora Itapuca Revisão Bárbara Reis Projeto Gráfico e Diagramação Editora Itapuca Foto do autor Brunno Carvalho Arte da capa e ilustrações Rozzo, Recife Rozzo é natural do Recife. Graduou-se, com láurea, em Artes Visuais na Universidade Federal de Pernambuco e, atualmente, é mestrando no programa associado de Artes Visuais UFPE/UFPB. Atua como professor de desenho e história da arte, pesquisador e ilustrador.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) eDOC BRASIL, Belo Horizonte/MG
E92m Evangelista, Víctor. Minhas poesias e seus porquês / Víctor Evangelista. – Niterói, RJ: Itapuca, 2021. 104p. il. ; 14 x 21cm. ISBN: 978-65-86655- 63-6
1. Literatura brasileira – Poesia. I. Título CDD 869.1
Elaborado por Maurício Amormino Júnior – CRB6/2422
2a Edição – 2021 Editora Itapuca – Niterói RJ
[email protected] www.editoraitapuca.com.br
Dedicatória
A Georgia, minha mãe, que me ensinou o que é o amor – mulher dedicada, sempre colocou os interesses dos filhos acima dos próprios;
a Carlos Magno, meu pai, de quem herdei os genes poéticos – educador cujo rigor forjou meu caráter e que não poupou esforços para prover minha instrução;
a meus avós, por todo o apoio que sempre foi dado a mim, meu irmão e minha mãe;
às musas que me inspiraram;
a Gabi, minha afilhada.
Agradecimentos
A Deus, por tudo que existe em mim e a meu redor;
a Felipe, meu irmão, melhor homem que já conheci e “incansável revisor de meus escritos”;
a Márcio, amoroso tio e o primeiro leitor deste livro;
a Flávio Henrique, primo querido e grande apoiador de minha arte;
a Danilo, amizade antiga, que testemunhou o surgimento do poeta em mim e, generosamente, emprestou seu talento a meus projetos audiovisuais.
Levei cerca de quinze anos para escrever as poesias e, praticamente, duas semanas para redigir as análises durante o isolamento social a que se submeteram os brasileiros, na pandemia da COVID-19, em 2020. Ressalta-se aqui o poder da arte, tanto para quem produz quanto para quem consome. Compor, para mim, normalmente consiste em maximizar, de modo infinito, os sentimentos, próprios ou observados. Cada poema, por sua vez, tem uma história, e compreendê-los plenamente está longe de ser uma missão fácil. É bem verdade que são cabíveis tantas interpretações quantos sejam os leitores. Uma vez que se produz arte, em qualquer de suas formas, coloca-se, no mundo, uma espécie de meio de transporte espiritual, que conduzirá cada indivíduo a uma jornada diferente, única. Todavia, é comum que exista, no mínimo, uma linha lógica perfeita, para o entendimento da obra: a de seu criador. No caso da literatura, temos a sorte de contarmos com brilhantes professores, que se debruçam sobre os textos, conseguindo, muitas vezes, “ler as mentes dos autores”. Mas, e se o próprio escritor lhes dissesse o contexto em que a poesia foi escrita? E se lhes explicasse os recursos utilizados? Acredito ser essa uma ideia original, que permitirá ao leitor compreender melhor o “eu lírico”, que não se confunde necessariamente com o artista. Não escrevi um texto meramente analítico. Pretendo proporcionar uma sensação de diálogo, a partir de uma redação meio dissertativa e meio pessoal, tanto sobre questões técnicas quanto a respeito dos fatos da vida inspiradores da obra. Espero que gostem! Víctor Evangelista
Sempre enxerguei o ofício da ilustração como uma ferramenta possibilitadora de diálogos. Não se trata apenas de desenhar algo destinado a acompanhar um escrito, mas também de traduzir, por meio de linhas, pontos e traçados, uma perspectiva própria do artista plástico, que ganha expressão a partir do contato com o texto. Quando fui convidado por Víctor para ilustrá-lo, sabia que teria pela frente uma tarefa que me exigiria entrega ao trabalho, ao texto e, principalmente, à conversa com o autor. Os resultados de tal interação, estejam além ou aquém das
expectativas, são, por vezes, surpreendentes, mas sempre se desenvolvem em um processo que deve, acima de tudo, ser respeitado e compreendido. Mesmo quando não se definem como autobiográficas, as ilustrações carregam um pouco de seu criador; as que estão neste livro não poderiam ser diferentes. Talvez você se pergunte o significado de cada um de seus elementos gráficos, mas, sinceramente, espero que não chegue a conclusões. Peço que, ao se deparar com os desenhos, realize o mesmo exercício pelo qual ei ao ler as poesias. Deixe-se contaminar pelos escritos e pelos traços, para encontrar suas próprias significações. Desejo a você, por fim, uma boa jornada. Rozzo
Sumário
Sozinho 11 Camões contra Aristóteles 14 Enojas-me 16 O faxineiro da alma 20 A meu irmão 22 Peito vago 24 Se tiver como, perdoa 26 Meu pai 28 Momento perfeito 30 Tempos de corona 32 O último cigarro 36 Sufocante indiferença 38 Que a nossa história não seja o meu carma 40 Quando chega ao fim 42 Meu tempo 44 A melhora súbita 46 O amor é um grande engano 48 Juras 52
Dias de chuva 54 À minha mãe 56 Cansei-me 58 Amor catatônico 60 Todos os meus crimes estão prescritos 62 Meu Recife é único 64 Já não amo meu Deus sobre todas as coisas 68 Infecção amorosa 70 Meus pecados 72 Tentação 74 Nas ladeiras de Olinda 76 Imodéstia 78 A dor da despedida 80 Plácido Recife 84 Sobre ir ou ficar 86 Amor de araque 88 Juventude 90 Desculpas tardias 92 Culpa 94 A paixão é minha droga 96 Diagnóstico 98
Infantaria Nacional 100
Sozinho
A vida é mesmo traiçoeira: Deixou-me sonhar por um segundo E, depois, dessa maneira, Te levou pro Velho Mundo.
Eu só queria te ter inteira E te dar amor profundo! Foi crueldade, não brincadeira, Deixou-me moribundo.
Sabes o que mais me dói no peito, Faz-me sentir dor anormal? Teres partido pra estudar Direito Num lugar tão longe como Portugal.
Atirei-me direto em meu leito E chorei, chorei um temporal.
Não há mais como, está feito. E, nunca, um feito me fez tão mal.
Parei e, parado, insatisfeito, Olhei o mar e o azul celestial... Nenhum homem deveria estar sujeito A sofrer tanto, tanto assim, como animal.
À noite, quando me deito, Penso em ti e é fatal: Tudo já foi tão perfeito, Por que tinha que ter final?
Compra um carretel de linha E amarra no meu peito, forte! E, qualquer que seja a tua sorte, Estará ela presa à minha.
Nunca estarás sozinha, Desde que o carretel tu portes. E, se observares que ele aninha,
Ainda assim, não cortes!
Quando voltares pra me encontrar, Desfaz o teu caminho. Enrola a linha, devagar: Aqui estarei, sozinho.
Essa poesia romântica se refere a um relacionamento à distância. Quando finalmente conquistou o coração de sua musa, teve que se despedir dela, que já estava de malas prontas para estudar Ciências Jurídicas na Europa. Os mais atentos observarão que não julga a garota por partir, embora ela não o tenha deixado por uma força maior, mas porque assim decidiu – quiçá conjuntamente. Afirma, já na primeira estrofe, que foi a vida que a levou para o “Velho Mundo” – como era conhecido o continente europeu. O seu ponto alto é a plástica criada em torno do carretel, que representa a conexão do casal, fisicamente separado. O aninhar da linha pode ser entendido como as dificuldades enfrentadas no contexto, como a saudade, por exemplo.
Camões contra Aristóteles
Rejeito o pensamento aristotélico, Em seu princípio da não contradição. Para os males e bens do coração, Ridículo torna-se o intelecto.
Como se atreve a dizer Que algo, ao mesmo tempo, Não pode ser e não ser? E o descontente contentamento?
E quando te vejo, Tomado de saudade, E o gosto do teu beijo É um bem e uma maldade?
Vivo a desejá-lo, Mas me frustro, por enquanto,
Até que reparas os calos Nos meus olhos, dos meus prantos.
Aristóteles estabeleceu o princípio da não contradição, segundo o qual uma proposição não pode, ao mesmo tempo, ser verdadeira e falsa. Doutra banda, Luiz Vaz de Camões, ao tentar explicar o amor, em um de seus poemas, usou diversos paradoxos – figura de linguagem que apresenta ideias contraditórias. É uma das agens: “O amor é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói, e não sente; é um contentamento descontente, é dor que desatina sem doer”. A minha poesia surge a partir do confronto da perspectiva lógica, racional, do filósofo, ante o discurso poético do escritor português. Na demonstração da falibilidade do referido princípio aristotélico, o eu lírico se refere à saudade, que tem seu lado bom – enquanto lembrança feliz – e ruim, significando sofrimento. Não há como não mencionar aqui a música de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, “Que nem Jiló”. Na obra, apresentam-se duas perspectivas para a saudade, positiva e negativa. Vale conferir!
Enojas-me
Profundamente me enoja Tua vaidade. Tão egoísta! E a maneira como forjas as emoções... És uma artista!
Não te iludas de que há glória Em atitudes imaturas. Sempre, meu coração perfuras E saboreias tua vitória.
És sádica, cruel e desumana! Não te cansas de cuspir, sem receio, No amor que, de meu peito, emana, E que, do fundo de minha alma, veio.
Infelizmente, sei que tardo Em aceitar teu caráter vil,
Mas o farei, e o teu fardo Será chorar por quem te sorriu.
É um escracho! Vê-se diante da musa, que tanto o maltratou. Ela, em sua perspectiva, por vaidade, brincou com os seus sentimentos e foi dissimulada para o manter envolvido. Chega a compará-la com uma artista, pela excelência de sua performance. Adverte à garota que, embora tenha alcançado o êxito em seu jogo emocional, não existe glória nessa atitude egoísta e imatura, consistente em manipular um sentimento verdadeiro.
O faxineiro da alma
Meus monstros, em reunião, Numa festa de tormentos, Debochados, violentos, Bebem e transam pelo chão.
Culpas e terríveis medos São os grandes anfitriões, Que esperam, em mil vagões, A vinda de meus segredos.
No amanhecer do outro dia, Sem nenhuma recompensa, Eu arrumo essa imensa Confusão que me doía.
A poesia retrata uma noite mal dormida. Viu-se atormentado por diversos pensamentos negativos de culpa e medo. Esses seriam os grandes anfitriões de uma festa em sua mente, onde os seus monstros se confraternizam, embriagamse e copulam, aguardando a vinda de todos os seus segredos, num cenário de
angústia extrema. Ao amanhecer do dia seguinte, quando ele desperta, tem que restabelecer a paz de seu espírito, arrumando aquela bagunça. Ele é o faxineiro de sua alma.
A meu irmão
Se pudessem estudar os corações, Analisando todo o músculo, Desmembrando os amores das paixões – Dos enormes, os minúsculos –,
Sei que, a muitos, decepcionaria. Se me vissem a grande desproporção, Chorariam meus pais e avós – que agonia! –, Diante do pedaço de meu irmão:
O maior em volume e em peso, Que chega a causar inveja. Quem me ama, hoje, deseja, Por mim, ser visto como eu o vejo.
Por ele, mataria, acredite. Por ele, morrer é fácil.
Desistiria dos amores de Afrodite, De todas as riquezas dos palácios.
Brinca com a ideia de que o coração é a parte do corpo responsável pelos sentimentos, como se a composição física do músculo – ou órgão – estivesse associada aos amores do indivíduo, em volume e peso. Na segunda estrofe, anuncia que, se fosse submetido a um estudo, muitas pessoas restariam decepcionadas por força das conclusões a que chegariam. Descobririam a disparidade, na comparação dos tamanhos das partes atribuídas a cada pessoa querida, ante o pedaço do irmão. Não hesitaria em matar ou morrer por ele. Pela mesma razão, renunciaria às riquezas do mundo e às mulheres – fazendo referência à Afrodite, deusa grega do amor e da beleza.
Peito vago
A vontade de escrever me toma, Mas, quando encosto o lápis no papel, Todo o desejo me abandona, Amarguro estar longe do que é meu.
Dou um gole, dou um trago, Mas não trago mais sentimentos. Esse é o meu tormento, O meu peito é que está vago.
A paixão pelas letras, Que me é peculiar, Nunca deixei de exercitar, Mas a emoção não me penetra!
A estrofe muito me custa. Não me faltam os caracteres,
Mas o que mais importa teres: O sentimento é minha busca.
Aqui, há um exemplo de metalinguagem. Expõe-se a dificuldade para se escrever poesia. Nesse ofício, é preciso estar atento a, no mínimo, dois aspectos: o formal e o material. O primeiro depende de fatores como o conhecimento da língua; já o outro, da criatividade e sensibilidade na exteriorização da mensagem. O lamento do personagem se dá ante a ausência da emoção inspiradora, o seu peito está vazio. Em que pese afirmar possuir a técnica para escrever, isso nada lhe adianta, já que não se sente motivado. Recorre, inclusive, ao entorpecimento – quanto ao gole, entenda-se tratar-se de bebida alcoólica –, mas, ainda assim, infrutiferamente.
Se tiver como, perdoa
Peço perdão a toda mulher Que, um dia, eu tenha magoado. Nunca foi nem será por querer, Mas quem age sem dolo ainda é culpado.
Se não tive paciência o suficiente, Ou não sorri do que você dizia, Peço perdão, mas principalmente, Se, na hora do fim, me faltou empatia.
Sobre a dor que era só sua E as gordas lágrimas que vi cair, Se tiver como, perdoa. Foi só agora que as entendi.
Nunca negue um último carinho, Ou deixe de atender uma ligação.
Se é um que escolhe o caminho, É do outro que se parte o coração.
Dirige-se às mulheres que aram por sua vida. Pede-lhes perdão por suas atitudes imaturas e insensíveis. Após ser dispensado pela sua então companheira, aprendeu a se colocar no lugar emocional das outras. De todas as falhas que podem existir no sentido exposto, condena, especialmente, a falta de empatia na hora do término.
Meu pai
Ele me é exemplo constante; E professor da maior lição. Se, no exército, me forjaram aspirante, Forjou-me, meu pai, cidadão.
Não assistiu aos jogos escolares; Em certas horas, levantou-me a mão; Edificou, em mim, os pilares De amor e educação.
Se, algum dia, fui-lhe injusto, Aqui, todo o mal se vai. Erguerei, para ele, um busto Com os dizeres “Meu pai”.
Tive a honra de prestar o serviço militar obrigatório e essa situação foi uma das inspirações para escrever a poesia. Nas paredes da escola em que fui formado – Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva –, havia várias mensagens valorosas. Era uma delas: “Aqui se forjam homens com a têmpera do aço”. Esse
cenário justifica a referência da primeira estrofe. A expressão “aspirante”, por sua vez, diz respeito à patente militar, “aspirante-a-oficial”. O texto aborda a importância do pai – claro, sem desprezar as mães, que também exercem esse papel – na transmissão dos primeiros valores fundamentais, de cidadania e caráter. Ainda, destaca a falta da participação paterna na sua vida escolar, e faz menção a uma educação rigorosa. Diga-se, todavia, que, nos tempos modernos, o castigo físico em uma criança é uma prática cada vez mais abominada, podendo configurar crime. Décadas atrás, contudo, não era rara. Por fim, esclareça-se que o busto que se pretende erguer, trata-se, metaforicamente, da própria poesia.
Momento perfeito
Tive um momento tão perfeito, Até agora estou em paz. Talvez, não entendas, mas É que não sabes viver direito.
Eu escutava Amália – A grande musa do fado –, Enquanto lia, alucinado, O poeta que me calha:
Sim, era Augusto, O meu anjo sem-par. É difícil o decifrar, Mas me esforço, vale o custo.
Esqueci-me dos problemas... Ah! Deus, foi tão bom:
Tristes notas, alto tom E os mais incríveis poemas!
É uma homenagem a dois grandes artistas: Amália Rodrigues (fadista portuguesa) e Augusto dos Anjos (poeta paraibano). Retrata um momento sublime: ler poemas de Augusto, enquanto se escuta Amália cantar. Há uma referência ao texto do escritor que, embora seja de difícil compreensão, vale a pena ser decifrado.
Tempos de corona
Fica em casa, pois o mundo desmorona! Poucos são os heróis que poderão Agir nessa situação Caótica causada pelo corona.
Tua parte é tão pequena nessa guerra. E fazer o que te dá veneta Demonstra seres indigno do planeta: Ignorante ou egoísta, erras!
Pergunto-me se vale a pena Salvar essa humanidade, Que, sem solidariedade, Ignora a quarentena.
Basta de tantos deslizes! Sejas da Esquerda ou da Direita,
Fica em casa, não pondera, aceita. Juntos, venceremos essa crise!
Essa poesia foi escrita durante o começo do período de distanciamento social pelo qual o Brasil ou – na verdade, grande parte do mundo –, decorrente da pandemia causada pelo coronavírus, em 2020. Enquanto algumas pessoas adotaram uma postura compatível com a sua gravidade, outras foram mais negligentes quanto às recomendações das autoridades constituídas e sanitárias. Pede-se ao leitor que não pratique atos irresponsáveis capazes de contribuir para a disseminação do micróbio. Em seguida, questiona-se se a humanidade, que não colabora para a resolução de uma crise comum, merece ser salva. Entretanto, importa dizer que, um ano depois, a resolução desse problema se mostrou muito mais complexa, ante os impactos socioeconômicos do isolamento. Ainda, há um alerta de que a situação se trata de um problema de todos, tanto da Esquerda como da Direita – referindo-se à forte polarização política que dividia o país. Por fim, anuncia que, com união, seria possível vencer aquele mal.
O último cigarro
Foram tantos os últimos cigarros, Que eu simplesmente perdi a conta! Nisso tudo, o que mais me espanta É a fé a que me agarro:
“Como foi bom dar este último trago... Soprar, pela última vez, a fumaça. Não fumo mais, o que quer que faça!” E, solenemente, a brasa apago.
Despeço-me, calado por um instante, Daquela sensação tão peculiar, Apegando-me à certeza angustiante De que ela é capaz de me matar.
Muitas juras então eu faço: “Amanhã, torno-me um atleta!”
Mas o vício a razão afeta, E, cedo, compro outro maço.
Nem sempre, um fumante consegue largar o tabagismo imediatamente após decidir fazê-lo. Recaídas são comuns. Nesse contexto, por diversas vezes, ele diz a si mesmo que está diante de seu último cigarro. Essa é a razão de ser do primeiro verso. No meu caso, como numa cerimônia particular de despedida, dei uma tragada final mais demorada, seguida de uma baforada também longa, até que apaguei, solenemente, a brasa, querendo me convencer de que aquilo havia sido o fim de tudo. Repeti o protocolo incontáveis vezes, até o dia em que, de fato, abandonei o maldito hábito – ou vício. Parabéns aos mais determinados, que não am por esse processo todo. Voltemos à poesia. Na terceira estrofe, reconhece-se a nocividade da conduta suicida. Após, faz-se referência a um compromisso de mudança de estilo de vida, todavia, na parte final, o eu lírico sucumbe à tentação e compra outro maço. Foi publicada, sob outro título, numa antologia fruto do quarto concurso literário promovido pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, em 2018.
Sufocante indiferença
Esqueceste que eu existo! Tua indiferença me alucina. Sofri algumas dores, mas esta Certamente é a pior, menina.
Recordo, saudoso, outros amores, Tempos em que não sofria tanto... Se, algum dia, procurar-me fores, Tu só irás me encontrar em pranto.
Não há dia em que essa dor não consuma Mais um pedaço do meu peito e corte Meu fio da vida, fazendo dela uma Esperança de descansar na morte.
Quando gostamos de alguém, às vezes, saber que aquela pessoa é simplesmente indiferente à nossa existência nos pode soar até pior do que o fato de nos odiar. A ideia do título é remeter à sufocação indireta, pela compressão do diafragma, ante o metafórico peso da indiferença da musa. Recorda-se, com saudade, das
suas outras paixões, porque não sofria tanto como ao cultuar a atual inspiradora. Anuncia ser essa a pior das dores que conheceu e, por sua causa, sonha com a própria morte! Faço questão de esclarecer, todavia, que, para mim, esse exagero poético não deve ser valorizado na vida real. Como digo em outro trecho desse livro, não acredito que uma pessoa deva ser, dessa forma, a razão da vida de outra.
Que a nossa história não seja meu carma
Não me arrependo de minhas condutas – Nem daquelas que geraram carmas! Nessa vida, morre quem não luta, E, numa luta, se usam armas.
Às vezes, são desproporcionais. Por que não dizer “injustas”? E, se sobrevivi às guerras tais, Tenho que pagar as custas.
A única coisa que espero, Dessa vida expiatória, É que Deus, em Sua glória, Não me prive do que mais quero.
Que me deixe só com uma perna, Ou leve todo meu dinheiro,
Mas seja nosso romance inteiro A mais linda história eterna.
Faz-se uma reflexão inicial sobre as guerras pessoais da vida e os erros que nela, eventualmente, são cometidos. Conforme minha compreensão leiga da lógica do Espiritismo, essas falhas trarão conseqüências dolorosas ao indivíduo, que se desenvolverá pelo sofrimento. Na poesia, não se negam os desvios ou se pede clemência por eles, são reconhecidos. Há resignação ante as lições a serem aprendidas. Todavia, externa a preocupação de que Deus promova o ensinamento – referência ao pagamento das custas –, precisamente, por meio de sua relação amorosa. Foi publicada, sob outro título, numa antologia fruto do segundo concurso literário do Tribunal de Justiça de Pernambuco, no ano de 2016.
Quando chega ao fim
Quando, miserável, a desconfiança, Sorrateiramente, se apodera De toda a tua paz, o que se espera É logo não haver mais esperança!
Quando pensas que estás sendo traído, E até teus amigos fazem chacota, Transforma-se em anedota A jura que havia te convencido.
Quando dormir se torna difícil, E a cabeça parece arder em brasa, Estás louco e o hospício, Em breve, será tua nova casa.
Quando eu, que nunca falei assim, o a descrer nessa história confusa,
É sinal de que a condição de musa Alcançou, então, seu fim!
Às vezes, todos ao redor já perceberam que uma relação não tem como prosseguir, menos os envolvidos. O texto retrata o despertar quanto à questão referida. Enumeram-se, a cada estrofe, as evidências do fim. Ao se perder a confiança, pedra fundamental do amor, a meu ver, pouco resta a um casal fazer.
Meu tempo
Por quanto tempo é sensato persistir? Por quanto tempo? Só se vive uma vez! Por quanto tempo é pra ficar só aqui? Por quanto tempo, Deus?! Digam-me, vocês!
O Meu Tempo não é o do relógio. Esse Meu Tempo quem marca é o coração. É ele quem diz se já deu Meu Tempo, Se, ainda, deu Meu Tempo não.
Aparentemente simples, o poema contém aspectos formais que o deixam mais interessante. Depreende-se da primeira estrofe que ele sente angústia a respeito de uma dúvida: por quanto deve insistir em um objetivo? Na segunda parte, a resposta é apresentada: a duração da luta deve ser determinada pelo coração, que, um dia, ou não, parará de pulsar pelo desejo. Devo dizer que, na vida real, é preciso muito cuidado e sabedoria na hora de tomar uma decisão dessa natureza. Importa esclarecer o seguinte: todos os versos da primeira estrofe têm onze sílabas poéticas; enquanto, na segunda, eles têm nove, onze, dez e oito, aparecendo desordenados. A ideia é criar uma referência de duração, como um padrão da sociedade. Todavia, em verdade, cada pessoa tem um tempo diferente para tudo. A expressão “Meu Tempo”, com as inicias maiúsculas, designa o tempo próprio do personagem, diferentemente do que acontece na primeira estrofe.
Quanto se deve insistir em um vestibular para o curso de medicina, por exemplo? Doutra banda, há pessoas que namoram por anos, mas am meses casadas. As coisas nem sempre são lineares e crescentes. Ainda, esclareço que todos os versos da primeira estrofe contêm perguntas, enquanto nenhum da segunda as possui: não há mais dúvidas!
A melhora súbita
O gemido do moribundo Não é o prenúncio da morte, Mas não há quem se e Ao melhorar em um segundo.
É no quarto de hospital Que se inicia a canção funérea, E ecoa sua miséria No corredor principal.
Enquanto estás sofrendo É sinal de que teu corpo luta, Mas a melhora súbita é o fim acontecendo.
Sabes o que mais me acalma? Nunca estive tão mal:
Disenteria, dores, uma sauna! É meu corpo em guerra mortal.
Não raro, testemunha-se um fenômeno fisiológico em pacientes enfermos em estado grave. Refiro-me a uma repentina e aparente melhora no quadro de saúde, que antecede a morte. A poesia aborda essa situação. Sua inspiração, todavia, foi uma virose sem maior importância.
O amor é um grande engano
Quando penso no amor, hoje, O que sinto é um grande enjoo. E, tu, se puderes, foge. Dele, corre e alça voo.
Devo a elas a evolução Que alguns chamam de amargura. Não sonho mais em vão E agradeço. Era loucura!
Foram tantas as minhas mulheres... Amar é sofrer, em minha ótica. E, nem se agora me disseres “Eu te amo”, nego a lógica.
Em Troia, causou a guerra, É a perdição dos insanos!
Aprende com quem erra: O amor é um grande engano!
Bastante pessimista! O amor é visto, após várias desventuras, como uma loucura, um erro, um engano. Há uma recomendação no sentido de que a interlocutora não se permita vivê-lo. Essa frieza é posta como uma evolução pessoal, embora se confesse que alguns a encaram como amargura. Ao fim, faz-se referência à Guerra de Tróia, que teria ocorrido por causa do amor de Páris e Helena.
Juras
Não faço juras de amor eterno, Nem prometo a relação perfeita. Tampouco te darei uma receita, Para transformar, em primavera, os invernos.
Mas uma coisa eu te garanto: Além do homem, um amigo. Não direi “Não chorarás comigo.”, Mas eu compartilharei do teu pranto!
Sempre achei essas palavras muito fortes. Antes de declamá-las, anunciava: “eis o que um homem precisa dizer a uma mulher!” Ante a banalização de declarações amorosas, ganham importância as posturas leais que os casais efetivamente apresentam, na resolução dos problemas que surgem em suas vidas.
Dias de chuva
É patético o meu jeito de amar-te, Ignoro a desilusão que bate à porta. É como se eu, armado de um bacamarte, Combatesse um exército. Não me importa!
Se me deres um olhar indiferente, Ainda assim, seguirei apaixonado, Pois é nutrido, em meu subconsciente, Esse amor inconformado.
Não penses que, por ti, sou feliz; Essa tolice me maltrata e irrita! Mas quero crer, terei o que sempre quis: Das mulheres que já vi, a mais bonita.
Os céus entrarão em festa, E Deus chorará de emoção.
Isso é São Pedro quem atesta: Dias de chuva virão!
Mais uma poesia em que a musa é praticamente idolatrada. Ignora a clareza cristalina do cenário desfavorável e se sente como alguém que, sozinho, trava uma guerra contra um exército. Por mais impossível que lhe pareça a vitória, não pensa em desistir. Na terceira parte, após maldizer o seu sentimento, externa confiança e esperança. Ao final, justifica o título: afirma que São Pedro, com dias de chuva, atestará o choro emocionado de Deus, quando Ele o vir com a mulher que sempre desejou.
À minha mãe
Ela, desde sempre, tão carinhosa... Eu, no começo, bem correspondia, Mas fui crescendo e, enquanto crescia, Deixei de tratá-la como uma rosa.
Levei anos pra me arrepender, Voltei a portar-me corretamente. A lembrança mais doce de minha mente, Daria tudo pra reviver.
Fui tomado pelo pavor No primeiro dia de aula, Como um bicho que abomina a jaula, Mas ela me acalmou.
Nada, nunca mais, me protegeu Como aquele abraço. E o calor materno
Ainda me aquece, pois é eterno: Amor de mãe, meu apogeu.
A criança costuma ser ligada aos pais, mas, enquanto cresce, tende ao distanciamento. Entendo que isso ocorra, pois o adolescente está na busca de sua própria identidade. Ao amadurecer, finalmente, reaproxima-se. Aborda-se essa jornada emocional do indivíduo. Num primeiro momento, deixa de ser paciente e atencioso com sua mãe, mas depois cai em si, voltando a comportar-se devidamente. Na poesia, é rememorado o primeiro dia de aula. Assustou-se com o novo ambiente, como um animal temendo a jaula. Mas, ao receber o calor do abraço maternal, acalmou-se.
Cansei-me
Cansei-me dessas besteiras poéticas E do drama em que transformo minha vida: Faço, de cicatrizes, feridas fétidas; Inutilmente, busco uma rima rica;
Poso de amante incurável; Exploro o amor não correspondido; Esforço-me para ser ágil, Mas, quando me encontro, estou perdido;
Uso paradoxos; faço confusões; Tento escrever algo nunca lido; Sou até capaz de transformar gemido Em grito de estourar pulmões.
Esta é a última de minhas poesias. Escrevi-a para me despedir.
Só sei escrever sobre agonias, Meu último ponto já está por vir.
Aborda a relação do escritor com o seu ofício. O personagem se encontra cansado de sua sensibilidade excessiva, que transforma tudo em composições dramáticas. Fala do desejo de ser original – comum entre os artistas –, além de outros aspectos, técnicos, como do emprego das figuras de linguagem e da busca pela rima rica. Aos que não estão habituados com o termo, explico. Há uma perspectiva para se avaliar um poema, sob os aspectos formais. Levará em conta fatores como a contagem das sílabas poéticas (que não se dá da forma tradicional) e a natureza das rimas, por exemplo. São consideradas ricas aquelas que envolvem palavras pertencentes a classes gramaticais diferentes entre si. Ironicamente, o texto traz várias terminações de versos que, além de não formarem combinações desse tipo, não rimam perfeitamente quanto à sonoridade. A ideia é que o escritor não depende do formalismo para se expressar.
Amor catatônico
Revolta-me, muitas vezes, Tua maneira de me invadir. Perco horas, dias, meses, Parado, sonhando, sem agir.
Este estado em que me pões, Perdido em pensamentos, Desagrada-me. Eu lamento Não arem de ilusões.
E, se componho, é porque busco expulsar-te de meu organismo. Através de movimentos bruscos, Tento cavar um grande abismo
Que nos separe em definitivo, Para a distância me dar a paz.
Não aguento um dia mais Desse meu amor nocivo.
O título “Amor catatônico” é um trocadilho com a expressão “amor platônico”, considerando a sua acepção de amor impossível, não correspondido. A catatonia é uma psicopatologia que faz com que o indivíduo enfermo alterne entre o estado de negativismo, letargia, ividade e o estado de euforia – ressalvem-se eventuais impropriedades técnicas. Inicialmente, externa sua insatisfação por, de súbito, os seus pensamentos serem tomados pela musa, fazendo com que tenha crises de ausência. Após, afirma que escreve como maneira de se libertar do sentimento que o consome. O termo “movimentos bruscos” remete a atos intensos e impetuosos, na busca desse objetivo.
Todos os meus crimes estão prescritos
Todos os meus crimes estão prescritos! É só isso o que tem me dado paz. Eu já não aguentava mais Viver culpado. Deus, nem acredito!
Quanto às minhas infrações penais, Todos os meus crimes estão prescritos! Então, que diferença faz Se nego, calo ou ito?
Não me assombram meus atos imorais, Hoje, vivo sem temer veredictos! Todos os meus crimes estão prescritos: Os de homem e os de rapaz.
Não me canso, digo e repito: O martírio dos problemas tais
É morto, findo, jaz! Todos os meus crimes estão prescritos!
Há diversas composições minhas que dialogam com o universo jurídico. Além das poesias, narrativas premiadas como “A escolha da carreira” e “DR de juristas”, por exemplo. Nessa análise, é preciso que se entenda, primeiramente, o que é “prescrição”. De forma pouco técnica, no Direito Penal, pode-se dizer que se trata do instituto que implica a impunidade do agente criminoso por causa do decurso do tempo. Não há como realizar a presente análise sem esclarecer qual foi a inspiração para essa composição. Do contrário, seria possível que se indagasse sobre a minha reputação. Como digo na nota do autor, escrever é maximizar infinitamente os sentimentos. O substrato emocional surgiu a partir do cometimento de uma infração de trânsito. O grande recurso estético dessa poesia, pra mim, é a repetição do título no primeiro verso da primeira estrofe, no segundo verso da segunda estrofe e, assim, sucessivamente. Designa a fala do eu lírico para o mundo e para si, na busca do convencimento de que pode ficar em paz. Foi publicada na ANTOLOGIA POÉTICA PRÊMIO POETIZE 2016, da editora Vivara.
Meu Recife é único!
Capital de um Estado de respeito, O Recife é cidade esplendorosa, Que orgulhosamente posa, Colhendo a glória por seus grandes feitos!
É no Nordeste a cidade sem igual, E tem cultura pra dar e vender. Quem não viu, venha conhecer O nosso soberano carnaval!
Foi aqui que a pátria nasceu – Eita, que história forte! –, E de onde partiram os Judeus, Para ajudar a fundar Nova Iorque!
Pontes e seus rios são cenário icônico, Fazem-no mais belo que a própria Veneza.
Se não acreditar nessa beleza, Veja, você, como o Recife é único!
Em que pese se brinque haver certa megalomania no orgulho recifense, é inegável que o Estado de Pernambuco tem destaque no cenário nacional – por aspectos históricos e contemporâneos. Ainda na época das capitanias hereditárias, por causa do solo massapê, favorável à cana-de-açúcar, ocupou posição privilegiada no ciclo econômico do vegetal. Há, ainda, vários outros fatos que lhe deram notoriedade, como a Revolução de 1817. Fala-se na soberania de seu carnaval, referindo-se ao Galo da Madrugada, que já foi considerado, mundialmente, como o maior bloco da festividade. Já o nascimento da pátria diz respeito à Batalha dos Guararapes, que, em verdade, se deu no Município de Jaboatão, integrante do Grande Recife, região metropolitana. Quanto aos Judeus que participaram da fundação de Nova Iorque, a história encontra respaldo em fontes sérias, como se verifica na Revista Super Interessante (matéria virtual, de fevereiro de 2018). Por fim, declara-se que o Recife é mais belo que Veneza, na Itália. Verdade ou não, a afirmação dá um toque ufanista ao poema! Ademais, como dizem, “a beleza está nos olhos de quem vê!”.
Já não amo meu Deus sobre todas as coisas
Entristece-me o que fiz a meu Pai, Filho ingrato e injusto é o que sou. A minha alma, do Éden, se vai: Expulsar-me-á, o Criador.
Quebrei um mandamento sagrado E é sangrando que vou embora. Ao longe, escuta-se meu brado, Sigo errado meu caminho agora.
Miro teus olhos, sinto-me ateu, Só tua presença me interessa. Esta alma, ao paraíso, não regressa Se esse lar não for o mesmo que o teu.
Enfrentarei o calor do inferno Pelo beijo que não me deste.
Quem sonha com os teus lábios não padece, Mas goza em prazer eterno.
Considero essa a minha primeira poesia publicável. Foi escrita em 2003, quando contava com apenas quinze anos. Não acredito ter sido um adolescente muito mais maduro que a média, mas começava a compor com profundidade. Pelo amor que nutre pela garota, percebe-se pecador e a a se sentir indigno de salvação. Afasta-se do Criador ao quebrar o primeiro mandamento, “amar a Deus sobre todas as coisas...” - a segunda parte do mandamento não é explorada nessa poesia. Importa deixar muito claro, entretanto, que essa conclusão não é baseada em um estudo religioso, frise-se! Todavia, embora lide com a culpa, é incapaz de negar a realidade. Ao mirá-la nos olhos, sente-se ateu – em verdade, não por desacreditar na existência divina, mas por desconsiderá-la. Ainda que fosse perdoado, não viveria no paraíso, se lá não habitasse a musa. Simplesmente por sonhar com o beijo que nunca deu, crê que estará em prazer eterno. Perceba que, seduzido pela musa, cheio de remorso e temendo ser punido, é o eu lírico quem se distancia de Deus, enquanto o acusa pelo abandono.
Infecção amorosa
A caneta que o papel macula Alivia meu peito do penar. Este que te escreve não simula. Intensa é minha dor, vou revelar:
Em minha boca há tanto sangue... Já, nas chagas, pus! Impiedoso como uma gangue, À morte, o amor me conduz.
Lamento, resistente, em meu leito, Esse momento de crueldade. Ah! Cupido, que felicidade Sentes em me destruir o peito?
Não tenhas dó de mim, Tu que o relato escutas:
Antes ser quem ama e luta Àquele que não sente assim!
O amor não correspondido é retratado como uma doença e o ofício do poeta, como uma forma de aliviar os seus males. Na segunda estrofe, há a plástica da mazela em um estágio avançado, em que o eu lírico expele sangue por sua boca, e as suas chagas já se encontram cheias de pus. Todavia, na última estrofe defende a ideia de que prefere adoecer e sofrer com esse mal do que viver sem experimentar amar.
Meus pecados
Eu tenho tantos pecados! De quais pecados queres que te fale? Tenho pecados que me falem, Nunca serão perdoados.
Pecados que me levam ao exílio; Outros, às celas mais escuras. Tão bom seria se minha cura Proviesse de rezar no milho.
Pequei contra os distantes, Pequei contra os mais próximos. Pecados esses tão gigantes, Uma jornada de erros máximos.
Conto-te, se te calares. Mas, além de imorais, são tóxicos!
Podes te contaminares Ou veres que somos sócios.
Trata-se de um diálogo confessional com o leitor. Os erros referidos seriam capazes de destruí-lo em vários aspectos. Gostaria de poder se redimir, através de uma penitência física mais simples, como rezar de joelhos no milho, mas não crê que será eficaz esse caminho. Diz a seu interlocutor que lhe revelará quais foram essas condutas, se ele prometer silêncio. Adverte, porém, que, além de imorais, são comportamentos tóxicos, havendo o risco de ele se contaminar – tornar-se cúmplice ou ar a também se sentir atormentado. Outra possibilidade seria constatar que já são sócios, ou seja, pessoas que compartilham das mesmas práticas. Essa poesia aborda o assombro pelos erros cometidos. Importa repararmos as consequências de nossos atos, mas precisamos aprender a nos perdoar.
Tentação
As emoções de minha lembrança Já não são satisfatórias, Nem os beijos de minha memória Trazem-me mais esperança.
Nos momentos de dor, diferente de antes, Escrever somente não me satisfaz. Ao extravasar, sigo adiante, Mas nem uma lágrima é capaz
De me dar o mínimo de conforto. É por isso que, confuso, Cogito atos obtusos: O que mais quero é estar morto!
Tentado fortemente sinto-me Pelos punhais, venenos e balas,
Ou torço para ter uma síncope E, brevemente, ocupar minha vala!
Chegou a se envolver com a musa, mas não lida bem com o término. Após se declarar insatisfeito por viver de recordações, afirma não ter mais esperança de reatarem. A sua dor não é mais aplacada pela composição de poemas, como costumava acontecer. Tampouco aliviar o sofrimento em pranto se mostra eficaz. Cogita recorrer a métodos que entende serem estúpidos, chegando a desejar a própria morte. Em que pese a força do poema, explorando o drama do personagem, saliento crer na vida como um valor a ser preservado mesmo ante as grandes dores e dificuldades. O mundo está repleto de pessoas incríveis e não creio que ninguém deva ser a razão de viver de outra pessoa. Na angústia, na adversidade, que se tenha fé em dias melhores.
Nas ladeiras de Olinda
Foi no final de minha infância Que provei da paixão ardente. Ela quem me fez adolescente E viver a maior de minhas ânsias.
Por vários anos, mantive-a sonolenta E tentei entender a minha vida. Ao deixar de ver a minha querida, Só estive como quem se aguenta.
Mas o destino, que, às vezes, é tão mal, E famoso por seu senso de ironia, Dessa vez, no mais incrível carnaval, Resolveu realizar minha fantasia:
Cumpri, de uma vez, a minha sina, Ao beijar, nas ladeiras de Olinda,
A mulher que sempre amei e que, ainda, Conservava o seu encanto de menina.
Reencontra sua paixão de infância num carnaval em Olinda, décadas depois de se afastarem. Pelo sentimento despertado, deixou de ser criança e entrou na adolescência, como na canção de Luiz Gonzaga e Zé Dantas, “O xote das meninas”, cujo trecho diz: “quando a menina enjoa da boneca é sinal de que o amor já chegou no coração”. Depreende-se da segunda parte que houve uma ruptura na convivência, e, nesse período, a paixão manteve-se viva, mas latente, enquanto o jovem tentava ressignificar a sua vida. A saudade, por sua vez, fez dessa época uma sofrida espera pelo reencontro. Finalmente, num carnaval, realiza a sua fantasia e beija a musa! Essa poesia foi publicada numa antologia fruto do terceiro concurso literário promovido pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, em 2017. Sagrou-se vicecampeã.
Imodéstia
A doença me consome. É cruel! Não me acovardo, permaneço altivo. Quem findará destemido serei eu. Que as minhas poesias vivam!
Que ganhem o mundo sem demora, E, afora, invadam as mentes, sem perder Nenhum segundo a mais da minha glória. Eu serei lembrado, não você!
Acusam-me de ser pequeno, Mas só almejo o que mereço. E a inveja é o veneno Por cujo mal eu não pereço.
Em um século, onde quer que eu esteja, E ainda falarem de mim,
Quero que se lembre e reveja O conceito de começo, meio e fim.
Encontra-se moribundo, mas não teme o fim, pois crê, plenamente, que alcançará a imortalidade por sua obra. Sonha com a glória e é arrogante no trato com o interlocutor. Acusam-no de “pequeno” – uma pequenez moral, de alguém soberbo –, mas afirma que a razão de ser dessa alegação é a inveja que desperta nas pessoas. Convida aquele com quem fala a rever o significado da vida e da finitude, ante a perpetuação de um nome na história, pela arte que foi capaz de produzir.
A dor da despedida
É véspera da partida, E esta minha dor é tanta, Que nada a mim adianta, Para vê-la reduzida.
Nunca, em toda a minha vida, Senti esse nó na garganta. Sempre cresce e se agiganta, Não se desfaz com bebida.
Das ocasiões sofridas, Castiga-me mais a janta. Só penso em mim sem a santa Hora da família unida.
Minha poesia lida, Até na voz de quem canta,
É desabafo e aquebranta Esta dor da despedida.
Esse texto é bastante claro, mas prefiro não deixar de fazer um apontamento ou outro sobre a ideia nele apresentada. Da estrofe inaugural, depreende-se a iminência da partida. A princípio, nada consegue aplacar a angústia dela decorrente.O personagem se mostra apegado à família e afirma nunca ter ado por aflição semelhante. A referência à bebida deve ser entendida como à alcoólica. Infelizmente, não raro, as pessoas se embriagam para lidar com sentimentos difíceis. Todavia, na situação retratada, nem isso é capaz de minimizar a dor. Somente o compartilhamento de sua arte com o mundo traz algum alívio. Essa poesia foi publicada numa antologia fruto do “I CONCURSO NACIONAL NOVOS POETAS”, da editora Videira, em 2011.
Plácido Recife
Recife, do comércio, da cultura, Dos carnavais, do futebol; Recife, da política, da economia, Capital do Estado que traz, na bandeira, o Sol;
Recife do ufanismo; Para alguns, da megalomania, Quantas vezes contribuíste para história deste país? Quantas vezes foste gigante?!
Não foi à toa que te tornaste o orgulho de milhões, Que batem no peito ao dizer: “Sou do Recife!” Tu és teu povo, que não foge à luta, E que, hoje, responsável, te socorre. E que estará por ti o quanto precisares, Até voltares a ser “o Recife das multidões”!
Mais uma poesia que enaltece a cidade do Recife! Foi escrita no contexto da pandemia de COVID-19, em 2020, ante o cenário raro das ruas vazias na capital pernambucana. A cidade, tão relevante em diversos aspectos sociais, naquele momento, via-se silenciosa, parada para a contenção do vírus.
Sobre ir ou ficar
Eu preciso de uma dose de sentido, Querer enriquecer já não me basta. Quanto mais penso, não consigo Encontrar a grande resposta.
É bem verdade que o Cupido Dá mais leveza a quem se arrasta, Mas toda trilha tem perigo, E a paixão, dele, é composta.
Diz uma voz em meu ouvido: “Triste daquele que se afasta Da família ou de um amigo, De tudo mais do que se gosta.”
É por isso, meu querido, Que essa dor, tão nefasta,
Angustia-me, enquanto sigo Com essa dúvida exposta.
Encontra-se exausto do modelo de vida em que se busca a evolução patrimonial em detrimento da própria felicidade. Todavia, não sabe como agir, pois é preciso garantir a sobrevivência, e tem receio de se arriscar. Vê-se num contexto em que pode fazer algum movimento que fará bem a seu relacionamento amoroso, como se aproximar geograficamente de uma namorada, por exemplo. Todavia, sabe que, embora o amor deixe a vida mais bela, é um risco, pois as relações podem terminar subitamente. Ademais, imagine-se que, para buscar um sonho – como uma carreira menos tradicional – ou estar perto da amada, parta, deixando família e amigos para trás... Haveria felicidade nisso? Vale observar a construção do poema quanto à forma. Num primeiro momento, os versos, parecem rimar entre o primeiro e o terceiro, e entre o segundo e o quarto, de uma maneira imperfeita, em cada estrofe. Na verdade, as rimas se dão, perfeitamente, entre as estrofes, quanto aos versos topograficamente iguais.
Amor de araque
Não quero ser seu carrasco, Mas sabe que não sou injusto. Desculpe-me se a assusto: O que sinto por você é asco!
Todas as vezes em que relembro A fé que tinha em você E o que sofri naquele dezembro, Envergonho-me de viver.
O seu dom é a trapaça, A deslealdade, a mentira. Provocou a minha ira, A caçadora tornou-se caça.
Agora, você que arque Com todas as consequências
De agir sem consciência Nesse amor de araque!
A moça, no início dessa história, agiu deslealmente, mas terminou se envolvendo de forma genuína. Por sua vez, o eu lírico, que antes a amava, ou a sentir repulsa por ela, ao descobrir suas condutas originais. Quando se recorda do quanto confiava nela e das lágrimas que derramou por ocasião do fim – designado pelo mês de dezembro – envergonha-se. A poesia é um trecho do diálogo entre os dois, quando ele é buscado, na tentativa de reconciliação.
Juventude
Eu, que sempre amei a juventude, Sempre a tive como meu tesouro, Hoje sofro com um mau agouro – Como pude, Deus, como pude?
Escolher ser livre foi minha loucura. É que, ao decidir partir sem ela, Deixei, acenando na janela, O mais lindo anjo de candura!
A dor se fundiu ao meu desejo E, não podendo eu voltar no tempo, Para pôr fim a este sofrimento, Explicaria a Deus, então, o que eu vejo.
Rogaria ao Onipotente Que me concedesse mais uma vida.
Esta, minha, está perdida, Mas a outra seria só da gente.
A expressão “juventude”, aqui, não deve ser compreendida apenas quanto ao aspecto cronológico, mas considerando a ideia de liberdade e descompromisso a ela usualmente associada. Ele fez planos para essa época de sua vida, entretanto, não esperava que o destino, tão cedo, lhe proporcionasse um encontro com o seu grande amor. Viu-se diante de um caminho bifurcado. Resolveu partir sem a musa, todavia, ou a nutrir um mau pressentimento quanto à decisão tomada. De toda forma, não é fácil concluir que tenha se arrependido, pois qualquer uma das escolhas traria implicações negativas. Ante a impossibilidade de voltar no tempo, a solução que encontrou foi pedir ao Criador que lhe concedesse mais uma vida. Nessa, escolheria permanecer ao lado da amada.
Desculpas tardias
Se, algum dia, existiu, de fato, Algo em que se pôde crer; Se, algum dia, fiz por merecer Qualquer um de seus ternos atos;
Peço que me ouça, Só mais uma poesia. Minha melancolia Decorre da história nossa.
Essa fenda, esse corte, essa chaga, Hoje, finda, antes que a morte chegue. Meu coração não é livre, mas vaga, Buscando alguém que o carregue
E o afaste de tamanha culpa, E lhe explique: “pra se arrepender,
Às vezes, é tarde”. Pedir desculpa Nunca mais me trará você!
Após o término da relação, apela à garota para que escute só mais uma poesia. Na tentativa de convencê-la, pede atenção, em nome das memórias felizes que já tiveram. Sente-se exausto de sofrer por ela e informa que o martírio, decorrente do peso das culpas carregadas, deve chegar ao fim. Do contrário, acabará por matá-lo. O seu coração não é livre – pois ele a ama –, mas vaga – numa plástica que remete a um andarilho desnorteado. Precisa de um novo sentido para a sua vida e entender que, não importa o quanto implore pelo perdão, o fim é irreversível.
Culpa
Provocas-me reações intensas, Que repudio e abomino. Repreende-me a consciência, Mas não adianta, pois me dominam!
A beleza encantadora me seduz, Confundindo, inteiramente, meus sentidos. Em meu corpo, sem cessar, ela produz As mais fortes sensações de libido.
Algo irresistível me aproxima Magneticamente de ti, criatura: Contemplo tua formosura, E me atrais, como um ímã.
Finalmente, escrevendo, Uso palavras insolentes,
Para cobrar-te, diferente: Um beijo, me estás devendo.
A relação que dá causa às palavras do personagem é ilegítima. Ao menos uma das partes é comprometida, ou existe qualquer outro empecilho moral. Retrata-se a tentação pela musa e o sentimento de culpa que consome o eu lírico. Na segunda e terceira estrofes, há uma repetição dessa ideia de sedução irresistível, e o desejo carnal é comparado com o fenômeno da atração magnética.
A paixão é minha droga
Como quem olha um viciado, Olham-me, hoje, meus amigos: Sem entender nada do que digo, Ou meu olhar apaixonado.
A minha dose é cada vez mais alta, E menores, ainda, os intervalos! “Quero mais!” É o que falo Quando sinto a tua falta.
À medida que te consumo, Pacifica-se o meu peito. De todos os efeitos, Essa paz é o suprassumo.
Se este for meu mal, Que eu morra, lentamente,
Pra viver, intensamente, Essa paixão até o final!
Há uma comparação entre a paixão e a dependência química. Relata-se a estranheza despertada, entre os amigos, ante o semblante e falas de uma pessoa apaixonada, como algo fora do alcance da compreensão dos demais. A necessidade da garota é crescente. Quando está a seu lado, consumindo-a, ou seja, usufruindo de sua companhia, é tomado pela paz. É cabível uma interpretação mais carnal nessa terceira estrofe. Por fim, aceita a possibilidade de estar se autodestruindo – ao se entregar demais a essa relação em que está viciado –, mas desconsidera caminhos alternativos.
Diagnóstico
Gotas de suor minha fronte umedecem, Depois que busco uma razão, com esforço, Para este amor ilógico; e, sem remorso, Peço a Deus pra me curar. É minha prece!
Meu Pai há de me abençoar, amém! Ele sempre atendeu à minha reza. Saiba: se hoje é você quem me despreza, Amanhã, provará de meu desdém.
Percebo, agora, que chega ao fim Essa paixão, ou melhor, doença. Mas não pense que perdi a crença Em todo amor, só neste que sim.
A poesia é o diagnóstico, E a mazela não vai além.
Já não há por que este meu trístico
Não deva encerrar também!
O título acusa que a paixão – ou amor, aqui não se faz distinção – é encarada como uma doença, e a poesia seria o seu diagnóstico médico (autodiagnóstico, em verdade). Revela o esforço para entendê-la e pede a Deus a cura desse mal. Garante à musa que, embora ele esteja sofrendo hoje, em breve, será a moça quem o buscará inutilmente. Na terceira estrofe, vê-se são e diz que, apesar da experiência negativa, não ou a descrer no amor como um todo. Argumenta que, se o poema é o diagnóstico de uma doença que já inexiste, também deve findar. Joguei com o aspecto formal. Explico! Falando-se em sílabas poéticas, que são contadas de uma forma diferente da tradicional, observa-se que: a primeira estrofe é composta de versos hendecassílabos; a segunda, de decassílabos; a terceira, de eneassílabos; a quarta, de octassílabos; e a quinta é um verso heptassílabo. Isso representa a cura progressiva do personagem, enquanto escreve, até forçar a ruptura da estrutura fundamental da quadra.
Infantaria Nacional
Em 1810, 24 de maio, Nasceu um homem, marcou-se um dia: Foi Antônio Sampaio, Patrono da Infantaria!
Arma nobre; arma audaz; Prova, do inimigo, o desespero; Não sente dor; não sente medo; Sua progressão é eficaz!
O oponente que se destrói por um fuzil infante, No momento agonizante, Sabe que tomba ante um herói.
Honremos, então, nossos símbolos, Agindo com a herdada dignidade.
Se combatermos com vontade, Seremos como nossos ídolos!
Amigos, vocês que aí estão, Silenciosamente, a me escutar, Nunca temam outra nação Que tente nos subjugar.
No combate, da selva à montanha, Pelos sertões ou no pantanal, Há a certeza de quem ganha: É a Infantaria Nacional!
É preciso, primeiramente, explicar um pouco da organização do Exército Brasileiro. Divide-se em armas, que designam as especialidades dos combatentes, como Cavalaria, Artilharia, Comunicações, entre outras. Servi em um Batalhão de Infantaria, que é conhecida como a “Rainha das Armas” – daí a referência à nobreza. Marcado pelo ufanismo, esse poema afirma que até o inimigo, ao tombar diante de um infante, reconhece estar sendo abatido por um herói. Conclama o leitor a honrar os seus símbolos – dois fuzis e uma granada –, agindo com a dignidade herdada dos grandes combatentes do ado, pois, assim, seríamos como eles. Afirma que não é preciso temermos outra nação, pois a Infantaria Nacional é a tropa mais eficaz e prevalecerá em qualquer ambiente: selva, montanha, sertões ou pantanal!
Nota do autor
Realizei ajustes em poesias da obra. Os textos não estão, necessariamente, idênticos às redações originais, aos posts do projeto audiovisual @tecontonapraca, aos primeiros registros em cartório, ou sequer às publicações em antologias. Realizei correções gramaticais, substituições de palavras, entre outras modificações. Pretendo que essas sejam as versões finais. Ainda, importa esclarecer que as definições oferecidas neste livro não têm precisão técnica, posto que conceitos como os de patologias e fatos históricos, entre outros, foram dados sem a devida pesquisa científica. Diversas informações foram apresentadas a partir do conhecimento pessoal do autor. Por fim, reforce-se que, embora alguns contextos das poesias possuam intercessão com a vida do escritor, não se deve presumir que são biográficas, ou que dizem respeito a pessoas ou acontecimentos reais. É possível que, a partir de um substrato fático, seja criado um universo ficcional. Doutra banda, a inspiração para compor pode advir da observação ou criatividade. Isso não deve ser esquecido.
O autor
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