EDIÇÃO 07 - ANO 03
MAN magazine A REVISTA DA MAN LATIN AMERICA
CAFEZAL Uma viagem pelos aromas da mais brasileira das bebidas
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ARGENTINA Veículos MAN aceleram no ritmo tango
TOM JOBIM Disco que flertou com a música americana faz 50 anos
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FOTO: SIMON PLESTENJAK
NA ROTA DO CAFÉ: DO CERRADO ATÉ A XÍCARA, UMA VIAGEM DE SABORES
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FOTO: PAULO JARES / ACERVO EDITORA ABRIL
OS 50 ANOS DO DISCO QUE FEZ OS AMERICANOS CORTEJAREM A BOSSA NOVA
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FOTO: ZÉ PAIVA
32 BLUMENAU: CLIMA DE OKTOBERFEST E SOTAQUE ALEMÃO O ANO TODO
FOTO: GILSON ABREU
CARNES, VINHOS, PEÇAS, ALIMENTOS. CABE DE TUDO NOS CAMINHÕES VOLKSWAGEN QUE CIRCULAM PELA ARGENTINA
FOTO: MARIANA DAVID
FOTO: SIMON PLESTENJAK
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A CANTINA DO DÉLIO É UMA DAS LEMBRANÇAS DE INFÂNCIA DA ATRIZ ADRIANA BIROLLI NA RUA ITUPAVA, EM CURITIBA
08 REDUZIDAS: EXPOSIÇÃO, PESQUISA, TREINAMENTO E FACEBOOK 30 KULTUR TOUR: UM EIO PELA ARTE, LITERATURA E RITMOS DA ALEMANHA 40 CRÔNICA: VIAGEM MÍSTICA AO HIMALAIA 42 FAROL: 2014 JÁ DESPONTA NO PARA-BRISA
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largada
NO EMBALO DO CAMINHÃO >>> Pelo segundo ano consecutivo a MAN Latin America foi eleita a Empresa mais irada do Brasil pela revista Carta Capital, no segmento de montadoras e importadoras de caminhões. Entre as indicações de mais de 2 mil executivos do Brasil e da América Latina, a MAN angariou quase 30% dos votos. É óbvio que um prêmio como esse é motivo de grande orgulho, afinal trabalhamos todos os dias para levar o melhor em tecnologia, inovação, qualidade e segurança aos nossos clientes. E ser lembrado por esses atributos é uma recompensa e tanto. Mas o que nós da MAN realmente gostamos é de ajudar o país a caminhar, ou melhor, a rodar. Basta pegar uma estrada para constatar que a nossa economia anda mesmo é de caminhão. Nas próprias páginas da MANmagazine há vários exemplos desse movimento, a começar pelo café. Como se sabe, o Brasil é o maior produtor de café do mundo há mais de 150 anos. Nesta edição, monitoramos toda a safra, do plantio ao beneficiamento dos grãos, ando pelas etapas de torra e industrialização até chegar às prateleiras de supermercados e cafeterias. Para cumprir a longa jornada, o café sobe pelo menos três vezes na caçamba de um caminhão. Se colocarmos na balança as viagens até o porto, no caso do produto para exportação, o número pode chegar a cinco. Uma cidade como Blumenau, que a a maior parte do ano se preparando para a tradicional Oktoberfest, também se movimenta sobre rodas. Afinal, não é fácil abastecer lojas, restaurantes, supermercados e pavilhões com embutidos, aves, cervejas, condimentos, doces, entre outras delícias da culinária alemã, para dar conta de tanto consumo. O bom é que não é só em solo brasileiro que o caminhão funciona como engrenagem do progresso. Após 15 anos de presença da MAN na Argentina, fomos conferir de perto onde e como os nossos produtos estavam sendo utilizados. Vinhos, carnes, combustíveis, automóveis, bebidas, chocolates... tudo gira na velocidade do caminhão, às vezes um pouco mais rápido quando a economia está aquecida outras vezes em marcha lenta, pegando impulso para crescer novamente. O importante é que tanto no Brasil quanto na Argentina o caminhão nunca para. < Roberto Cortes, Presidente da MAN Latin America
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FOTOS: ACERVO PESSOAL
>>> MARINA MOTA
EXPEDIENTE MANmagazine é uma publicação da MAN Latin America com edições em português e espanhol. Distribuição gratuita para toda a América Latina. Edição 7, novembro/2013 COMUNICAÇÃO MAN LATIN AMERICA Marcos Brito (gerente), Maria Carolina Gonçalves (editorial), Danielle Ritton, Larissa Rodrigues, Karina Ushimaru, Heloísa Tunoda (estagiária) e Wander Gartner (aux. istrativo) Rua Volkswagen, 291, 7º andar 04344-901 – São Paulo – SP www.man-la.com EDIÇÃO Parágrafo Editora Ltda. EDITORA Rosiane Moro MTb 21.082 DIRETORA DE REDAÇÃO Raquel Alves MTb 16.103 REVISÃO Daniela Lima PROJETO GRÁFICO ORIGINAL MAN Group AG DIREÇÃO DE ARTE Daniel das Neves TRATAMENTO DE IMAGEM Luciano Bernardes IMPRESSÃO LEOGRAF www.leograf.com.br TIRAGEM 8.500 exemplares PERIODICIDADE quadrimestral CAPA Simon Plestenjak
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A jornalista cearense mora em Buenos Aires há dois anos. Vasculhou a Argentina para mostrar as aplicações dos produtos MAN fora do Brasil. Quando ainda era estudante, fez estágio na CNN Internacional, em Atlanta. De Buenos Aires, colabora para vários veículos de comunicação brasileiros, como Valor Econômico, DCI e Diário do Nordeste.
>>> ARTHUR VERÍSSIMO O autor da crônica desta edição é considerado um dos jornalistas mais “gonzos” do Brasil. Colaborador cativo da revista Trip e repórter de TV e rádio, Veríssimo é capaz de se colocar nas experiências mais bizarras apenas para contar boas histórias. Escritor e DJ acidental, é o protagonista da série Na Fé, em cartaz no Discovery Channel. Aqui relata uma das muitas viagens que já fez à Índia.
>>> SIMON PLESTENJAK Há três anos no país, o fotógrafo esloveno já é considerado mais brasileiro do que muitos por aqui. Adora viajar atrás das autênticas raízes brasileiras. Suas fotorreportagens já foram parar nas páginas da National Geographic, Marie Claire, Época São Paulo, entre outras. Nesta edição, foi conferir a produção de café no interior de Minas Gerais, aos pés da serra da Canastra.
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FOTO: WAGNER MALAGRINE
ARRIBA!
MISSÃO CUMPRIDA Roberto Cortes, presidente da MAN Latin America, reafirmou ao governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, investimento de R$ 1 bilhão no estado fluminense entre 2012 e 2016. O ciclo de investimentos foi confirmado em cerimônia na fábrica da montadora em Resende (RJ), ocorrida no último dia 22 de outubro. Cortes e Cabral am um acordo para o desenvolvimento de novos produtos e ampliação da capacidade produtiva na fábrica MAN. “Nossa proposta é aumentar a geração de renda na região, uma ação que promovemos desde 1996, quando inauguramos nossa fábrica no estado”, disse Cortes.
Considerada uma das mais importantes feiras de veículos comerciais da América Latina, a Expo Transporte 2013, realizada a cada dois anos em Guadalajara, México, comemorou seus 15 anos no último mês de novembro, com público recorde de 25 mil visitantes. Mais uma vez o estande da MAN foi um dos mais concorridos da mostra, com a apresentação, versão Euro V, das linhas Constellation, Worker, Volksbus e MAN, produzidos na fábrica mexicana de Querétaro e em Resende (RJ). O país tem a segunda maior linha de montagem da MAN Latin America e do mundo. Além da fábrica em Resende, no Brasil, a empresa possui acordos para montagem dos seus produtos em Bogotá, na Colômbia, Nairóbi, no Quênia e em Port Elizabeth, na África do Sul.
FOTO: WAGNER MALAGRINE
DIESEL DE CANA
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Com 15% a menos nas emissões de NOx, 77% de redução nas emissões de material particulado e diminuição em 42% na temível fumaça preta, o diesel de cana-de-açúcar tem tudo para se tornar o combustível do futuro. É o que apontam os testes pioneiros com motor Euro V, comandados pela MAN em bancada dinamométrica. Com mais de 500 horas de testes, os resultados de potência, torque, consumo e durabilidade provaram as vantagens do biocombustível, associadas à tecnologia dos motores Euro V. Testes em estrada já estão em curso. A primeira fase envolveu caminhões Constellation Euro V da Coca-Cola Andina Brasil. Quatro caminhões 17.190 e dois 24.280 cumprem rotina normal de operação abastecidos exclusivamente com o diesel de cana.
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SÓ DE CURTIÇÃO
Uma foto curtida 5 mil vezes, em poucas horas. Tudo bem que o Constellation 25.420 exibia seu melhor ângulo para apresentar o novo motor de 420 cavalos. Mas, mesmo com o peso da novidade, impressiona o fato de tantos internautas frequentarem habitualmente a página da MAN no Facebook e ainda fazerem questão de comentar, curtir, manifestar opiniões. São comuns fotos e mensagens postadas pela marca arem dos 10 mil “views”. A relação amigável que se estabeleceu entre a MAN e seus clientes desde os primeiros posts abriu caminho para outras mídias como Youtube, Linkedin, Instagram e Google Plus, com excelentes índices de participação em todas. A MAN mapeia os interesses e impressões do público para antecipar tendências e novas demandas do mercado.
SOB MEDIDA
Produto sob medida não é apenas um jogo de palavras, mas um compromisso da MAN Latin America. Logo no início da sua operação, a empresa entendeu que a aplicação é que deve definir as características do veículo, afinal uma mudança simples no projeto pode significar um uso mais racional, seguro ou até muito mais econômico do produto. Para isso existe o BMB Mode Center. A unidade dispõe de técnicos e de todo ferramental para que as soluções personalizadas sejam incorporadas no caminhão ou ônibus, antes que deixem a fábrica, preservando a condição de originalidade. Entre os mais de 110 mil pedidos atendidos no BMB está o caminhão com segundo eixo direcional, que permite ao frotista ganhar mais 5 mil quilos de carga útil. A empresa também está apta para montar quinta roda nos cavalos mecânicos, terceiro eixo anterior (caminhão de lixo), terceiro eixo auxiliar (caminhão “trucado”), ônibus com piso baixo (low entry), escape vertical, ajuste de entre-eixos, ar-condicionado, tomada de força, freio retarder, instalação de volksnet e climatizador.
SHOW DE BOLA Transportar um time com a importância do Bayern de Munique, do Borussia Dortmund, do VfL Wolfsburg ou do Hannover é tarefa que exige padrões extremos de segurança e conforto. Pensando nisso, a MAN convidou os motoristas de ônibus dessas e de outras equipes do campeonato alemão para uma rodada de treinamento. Pelas contas da montadora, os 13 principais clubes circulam em média 60 mil quilômetros/ano pelas rodovias europeias. Agendas apertadas, distâncias longas, ruas estreitas das cidades históricas estão entre os principais desafios encontrados pelos motoristas. Para ajudá-los a chegar ao destino com tranquilidade, a MAN desenvolveu um programa que desmistifica a tecnologia de bordo e inclui aulas práticas para situações extremas, como enchentes e perigos que exigem resposta rápida e manuseio correto do veículo.
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Ponto a ponto
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GOSTINHO BRASILEIRO “Aceitam um café?” É assim que o diretor Ramiro Júlio Ferreira Neto nos recebe na sede da empresa Café Barão. É o início da nossa viagem, que começa na fazenda Lagoa, em Piumhi, no centro-oeste mineiro, e vai até a mesa da barista Eliana Relvas Por Denilson Vasconcelos Fotos Simon Plestenjak
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Na moderna lavoura de café, o trabalho manual ficou no ado. O que se ouve agora é o ranger das colheitadeiras. O que resta de poesia fica na mão calejada do trabalhador ao mostrar o fruto maduro chamado de cereja “Café com pão, café com pão, café com pão.” Enquanto estamos na estrada a caminho da pequena Piumhi, no interior mineiro, o poema ferroviário do pernambucano Manoel Bandeira ecoa nos ouvidos, sobe serra, transpõe rios e nos baldeia no ritmo do trenzinho do caipira. Do Mirante da Cruz do Monte temos uma visão panorâmica da cidade. O que se vê mais próximo, depois da escadaria de o ao local, é a unidade istrativa e industrial da Sociedade Mogyana Exportadora Ltda. Dali também se avista parte dos chapadões da mítica serra da Canastra, onde nasce o rio São Francisco. O povo do local se orgulha de dizer que a cidade é o Portal da Canastra. Estamos em 2013, porém o ponto de partida desta viagem está bem mais pra trás, em torno de três décadas, quando o Grupo Mogyana, especializado na produção de arroz, enxerga no boom econômico dos grãos no país o grande potencial do café arábica. E assim, na segunda metade da década de 1980, os primeiros frutos das mudas plantadas nas fazendas mineiras
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atingem a maturidade. Colhidos e beneficiados, os grãos são selecionados e levados a um criterioso processo de torrefação e moagem. É o início da linha de produtos com a marca Café Barão. O cheiro do café parece motivar o como dessa lavoura tão presente na cultura e nos costumes brasileiros. Um produto que, há um bom tempo, sobe no caminhão para ir do campo para a cidade, da fábrica até o comerciante varejista para, enfim, chegar à xícara do brasileiro – na mesa de casa, no balcão da mais simples padaria ou no requinte das cafeterias. O café, todos sabemos, tem dessas coisas. Anima a prosa. Aquece as aventuras literárias e as telas do cinema. E dali pula diretamente para o cafezal, que pulsa na modernidade ruidosa das colheitadeiras, uma realidade que, do último quartel do século ado para cá, esquenta a economia da região com a forte presença do tipo arábica de alta qualidade. Nas fazendas, as colheitadeiras substituem 150 pessoas por turno de operação. Mas são utilizadas ape-
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nas nas lavouras a partir da segunda safra. Naquelas de primeira safra, a colheita ainda é feita manualmente. “Agora começou a chover, é época de floração”, observa Ramiro Neto, diretor da Mogyana. Segundo ele, o momento ideal para a colheita é na “fase cereja”, quando o fruto está maduro. PÉS NO CHÃO, PÉ NA ESTRADA Ramiro Neto nos fala do produto, velho conhecido da família, já dos tempos do avô, que ganha novos contornos sob a chancela da empresa, cada vez mais conhecida pelo Café Barão. E nos leva à fazenda Lagoa, a mais antiga das seis unidades agrícolas do grupo – espalhadas pelos municípios de Vargem Bonita, Piumhi e Formiga. Lá, temos noção do processo que se desenrola no campo – plantação, colheita, lavagem e secagem dos grãos – até o momento em que o produto é embarcado no caminhão, que roda cerca de 50 quilômetros até a fábrica. No pico, faz esse percurso várias vezes por semana. O Constellation 24.250 6x2, dirigido por Antônio Carlos Faria, chega, a pela balança e descarrega na moega. Os grãos caem na esteira. Tem início a viagem até as caixas. Descascados, saem dali em sacas de 60 quilos ou nos chamados big bags, de 1,5 tonelada, e seguem para a etapa de classificação. A análise sensorial permite a padronização do produto e a criação de lotes. Seguindo os parâmetros estabelecidos pela empresa, grãos de diferentes origens e tipos de preparo são combinados para chegar ao blend, ou liga, que é o segredo da marca, responsável pela característica e qualidade do café e pela fidelidade do consumidor ao produto. A partir daí são emitidas as ordens que orientam o encaminhamento dos grãos para o processamento industrial. Sem contato humano, os grãos entram em dutos por elevadores e são levados até o torrador. Ali, outro sistema de classificação determina como será feita a “torra”. Um cheirinho danado de bom toma conta do ambiente. Torrados, são transportados até as caixas de armazenamento, onde descansam 12 horas, para a necessária liberação de gás carbônico.
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RETA DE CHEGADA “Café com pão, café com pão, café com pão.” A poesia de Bandeira baila na mente enquanto observamos a sequência, quando os grãos despedem-se dessa condição ao caírem nos moinhos. Reduzidos a pó, vão para as caixas de armazenamento e dali para as máquinas de empacotamento. O café embalado é acondicionado em caixas colocadas em pallets, estrechadas (tal e qual fazemos com malas e bagagens nos aeroportos para protegê-las) e levadas ao depósito. Entra em cena outro modelo de caminhão, o 9.160 Delivery. Com carroçaria tipo baú, esses veículos levam o Café Barão para o mercado. Carregados no período matinal, am a semana fazendo entregas num raio de 100 quilômetros da empresa. Na filial de Belo Horizonte, seguem rotinas parecidas. Dos grãos que saem das fazendas, parte é utilizada na industrialização do Café Barão. Nesse busca e leva de café arábica de produção própria e também de grãos provenientes de outros produtores, os caminhões cumprem papel relevante. Por isso, não raras vezes o Constellation 24.250 6x2 deixa a rotina fazenda/ indústria, em Piumhi, e percorre distâncias de até 700 quilômetros, chegando ao norte de Minas, por exemplo, como lembra o motorista Antônio Carlos, que trata o bruto com os cuidados que teria com o próprio carro.
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OURO AMARRONZADO Maior produtor mundial de café, respondendo por 30% do mercado internacional, o Brasil é o segundo consumidor, atrás apenas dos Estados Unidos. E caminha para assumir o primeiro posto. A meta da Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic) para o consumo interno é atingir 21 milhões de sacas em 2013. Para isso contribui o consumo fora do lar, com o número crescente de cafeterias e restaurantes oferecendo café de melhor qualidade. A relação com o café vem do século XVIII, desde que o sargento-mor Francisco de Melo Palheta fez a planta entrar no país pelo norte, ando por Maranhão, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Minas, e se consolidar a partir de meados do século XIX. Hoje, praticamente a lavoura se estende por todos os estados, mas firma-se em regiões de São Paulo, Minas, Paraná, Espírito Santo, Bahia e Rondônia. Mais importante parque cafeeiro do país, Minas Gerais planta café em 1.236,9 mil hectares – mais da metade dos 2.312.152 hectares de área cultivada nacionalmente. O sabor de novidade está no cerrado, onde o cultivo da espécie arábica ganha mais e mais espaço nas últimas quatro décadas.
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Na área industrial, o Constellation manobra para a descarga dos grãos. Adiante a “torra” enche o ambiente daquele cheirinho gostoso de café, presente no dia a dia de Jorge Elias Ferreira (centro) e dos filhos Ramiro e Vanessa O arábica (Coffea arabica), espécie originária do Oriente, produz café de melhor qualidade, mais fino e requintado, e é cultivado em regiões com altitude na faixa dos 800 metros. Já o Robusta (Conillon), originário da África, tem um trato mais rude e pode ser cultivado ao nível do mar. Claro, cada espécie tem um grande número de variedades e linhagens. Na região onde se situa Piumhi, o solo característico é o de “cerrado em transição”, cujas terras são tidas como, no mínimo, de média fertilidade, ou seja, de fácil correção para se tornarem de alta fertilidade sem grandes esforços técnicos. Não faltam, por ali, ribeirões e córregos com abundantes mananciais. Em Piumhi, a Mogyana aposta na qualidade do arábica para a produção do melhor café. Em pouco mais de duas décadas e meia, firma-se nesse mercado com enorme poder de crescimento. Segundo dados da Abic, a empresa, que em 2008 era a 39ª
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no ranking das cem maiores indústrias associadas, encerrou 2012 na 17ª posição. Com fôlego de sobra, pois, como diz o presidente da Mogyana, Jorge Elias Ferreira, “nosso objetivo é gerar um crescimento sustentável, promovendo o sucesso de nossos acionistas e parceiros e, principalmente, sempre superando as expectativas de nossos consumidores”. Juntamente com os filhos Ramiro Júlio Ferreira Neto (diretor executivo industrial e comercial), Vanessa Paschoa Ferreira Lemos Marques (diretora financeira) e Patrícia Paschoa Ferreira Coelho (diretora comercial BH e região metropolitana), Jorge Elias não só acredita na consolidação de produtos tradicionais da empresa, por exemplo o Café Barão, como também vê forte potencial de expansão do Espresso (grãos torrados), que só utiliza o café cereja descascado das próprias fazendas. Nos demais, são processados grãos de café arábica de produtores do sul de Minas e do cerrado..
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Após a embalagem, o café está pronto para consumo, não sem antes ar por um rigoroso teste de degustação de sabores e aromas
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ESPECIAIS EM ALTA Movida a café, a barista Eliana Relva não para. Mal chega de Belo Horizonte, onde participou de um evento internacional do setor cafeeiro, desembarca na cafeteria de um supermercado da Vila Mariana, na zona sul de São Paulo, para um workshop sobre cafés especiais e uma feira de cafés orgânicos de dez procedências distintas, produtos que estão nas gôndolas. Na plateia, gente comum, cliente da loja, interessada em saber um pouco mais sobre as novidades gastronômicas e os apetrechos para quem aprecia tirar um café diferenciado. Essa vida agitada a engenheira de alimentos leva desde meados dos anos 1990, quando foi convidada a participar da montagem do primeiro centro de café do Brasil, para o Sindicato da Indústria de Café do Estado de São Paulo. Gostou do sabor e dali para cá ministra cursos de formação de barista e de classificação e degustação de café. E ainda encontra tempo para integrar júris de concursos de profissionais. “Eu acho que o barista acabou virando uma necessidade”, diz Eliana. “Afinal, quem atende precisa, pelo menos, conhecer o produto para indicar essa ou aquela opção ao cliente da cafeteria ou do restaurante.” Para ela, o importante é que tenhamos a possibilidade de experimentar, sem receio, com um mínimo de orientação. O brasileiro parece pensar assim, pois, segundo a Abic, o consumo de cafés especiais, os chamados cafés gourmet, cresceu 15% anualmente de três anos para cá, contra a evolução de 3% do produto tradicional. Contudo, tradicional ou especial, o café não aceita desaforo. Em casa, aberta a embalagem, devemos guardar na geladeira não mais do que 15 dias. No preparo, água mineral ou, pelo menos, filtrada. Depois de pronta a bebida, consumir em até uma hora. Eliana reconhece que o consumidor precisa ter um mínimo de orientação. Mas reforça que há necessidade de arriscar. “Se ficar fraco, tente fazer de novo. Se sair forte, dilua com água quente.” As dicas principais estão em seu site www.elianarelvas.com.br, que também traz informações sobre cursos e organização de eventos. Agora é só colocar a água no fogo e apreciar a bebida mais tradicional do país.<
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Expert na arte de ser barista, Eliane Relvas prega que fazer um bom café não combina com acanhamento. Requer um mínimo de informação e uma boa dose de criatividade
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retrato
Capa do The Composer of Desafinado Plays, lançado em 1963 (acima); show beneficente de 1991 para arrecadar fundos para o carnaval da Mangueira (página ao lado)
SEMPRE NO TOM No ano que marca o cinquentenário de The Composer of Desafinado Plays, Tom Jobim tem sua obra revisitada. Voltamos no tempo para remontar a história do primeiro disco brasileiro gravado em solo americano Por Tom Cardoso
>>> É sabido que, além de compor as mais belas canções de nossa música, Tom Jobim era um grande frasista. Dos melhores – e dos mais ácidos. Duas frases ficaram famosas: “Viver nos Estados Unidos é bom, mas é uma merda. Viver no Brasil é uma merda, mas é bom” e “No Brasil, sucesso é ofensa pessoal”. Ambos os aforismos têm a mesma origem e são fundamentais para entender o quanto o autor de “Garota de Ipanema” e “Insensatez” era apaixonado por seu país, devoção que nem sempre foi correspondida à altura. Em 2013, completam-se 50 anos do lançamento de The Composer of Desafinado Plays, o primeiro disco solo em território americano, que lhe trouxe fama internacional e um punhado de aporrinhações. Sim, Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, o nosso mais genial e brasileiro dos compositores, foi acusado por parte da crítica – e por alguns colegas – de se render à música americana e fugir de suas origens. Logo ele, o autor de “Matita Perê”, que só tinha medo de uma coisa: “morrer em inglês”: “Quero morrer em português. Como é que vou dizer para o médico gringo que estou com uma dor no peito que responde na cacunda?”. Não teve jeito. Morreu em Nova York, em 1994, aos 67 anos. Há muitas histórias envolvendo os bastidores do lançamento do hoje “cinquentão” The Composer of Desafinado Plays. Não foi fácil para Tom deixar o Rio. Nascido na Tijuca, mas criado em Ipanema, foi obriga-
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do a se adaptar rapidamente ao caos de Nova York e praticamente sem falar inglês. Mas ele foi literalmente abraçado pelos músicos locais. Convidado a tocar de madrugada na boate Village Gate, um dos primeiros shows em solo americano, não tinha nem roupa para encarar o tenebroso inverno nova-iorquino. “Descobri naquele país muita generosidade. Sem roupa certa para o frio, vi um crioulo da orquestra colocar seu sobretudo sobre as minhas costas e continuar seu trabalho”, afirmou Tom, em entrevista. Da leva de músicos que foi para os Estados Unidos, no embalo do sucesso da bossa nova, Jobim foi um dos poucos a não voltar, muito por conta da sua amizade com o saxofonista Stan Getz, uma das lendas do jazz americano. Tudo porque os americanos, os que apreciavam o jazz de alta qualidade e reconheciam o valor da música brasileira, veneravam Tom Jobim. Assim que The Composer of Desafinado Plays foi lançado, em 1963, as portas do mercado americano se abriram. E não foi apenas Jobim que entrou: uma legião de músicos, inclusive João Gilberto (que um ano depois gravaria o histórico Getz & Gilberto ao lado de Stan Getz), beneficiou-se da boa aceitação da bossa nova, que logo virou febre entre os americanos. O auge desse intercâmbio, como se sabe, se deu em 1967, quando Frank Sinatra, o mais popular cantor de todos os tempos, convidou Tom Jobim para gravar um disco inteiro em parceria.
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Na época, Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim só perdeu em críticas elogiosas para Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, considerado até hoje o disco que mudou a cara da banda inglesa. Mas Tom recusou-se a fazer o jogo das gravadoras americanas. Anos depois, ele declarou: “Meu contato com as gravadoras americanas havia sido difícil, mais por questão de temperamento do que outra coisa. Nunca fui homem de cair na estrada, propagar minhas músicas, discutir minha participação (...). Meu inglês foi aprendido no colégio, nos filmes de cowboy, e o pessoal lá queria colocar letras absurdas nas minhas músicas, falando de café, banana e coco. Uma vez cheguei até chorar. Comecei, então, a lutar pela preservação do que era meu, brasileiro, original”. Acolhido pelos músicos americanos, mas se recusando a ser a versão masculina de “Carmen Miranda”, Jobim bateu o pé – contra a vontade da mulher, Thereza, que insistia em voltar ao Rio. Aprendeu inglês por conta própria, de um jeito pouco convencional: usando o dicionário. Para o crítico de música Tárik de Souza, Tom Jobim, se quisesse, já podia encerrar a carreira naquele momento e voltar ao Rio para curtir o som dos ari-
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nhos no Jardim Botânico. “The Composer of Desafinado Plays é ao mesmo tempo a estreia solo de Tom Jobim, já aos 36 anos de idade, e sua afirmação como extraordinário compositor e intérprete econômico, a bordo de uma marca pessoal, o ‘one finger piano’”, afirma Tárik. “Se a bossa nova tivesse produzido apenas este disco já estaria plenamente justificada”, escreveu na época um crítico da severa revista americana de jazz Down Beat. Para quem dizia que Jobim copiava o jazz, foi um tapa na cara. Com luvas de pelica, como era seu estilo. Crise do “amor com flor” Enquanto nos Estados Unidos Jobim gravava com Sinatra – e era gravado por ases do jazz como Quincy Jones e Dizzy Gillespie –, no Brasil, a bossa nova, gênero criado por Jobim e João Gilberto, andava em crise. Uma crise de identidade, sofrida por parte da classe bossa-novista, que não via mais sentido rimar amor com flor em tempos de regime militar. Essa dissidência era liderada por Nara Leão e Carlos Lyra. O fogo amigo atingiu Tom Jobim, que já vinha sofrendo duras críticas da patrulha ideológica, turma que tinha como alvo os tropicalistas Caetano Veloso
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e Gilberto Gil e que também pegou no pé de Jobim quando ele ou a morar nos Estados Unidos e gravar com jazzistas. O tempo ou, o regime militar acabou, o Brasil ou a viver uma democracia plena e a patrulha ideológica ou a ser tão démodé quanto a calça boca de sino. Entre as matérias publicadas sobre The Composer of Desafinado Plays, um dos maiores críticos de música do país, José Ramos Tinhorão, considerado – por ele próprio – o “inimigo número 1 da bossa nova”, classificou o disco como um sinal claro de que Jobim havia, como ele alertara, se “vendido aos americanos”. O crítico chegou até a implicar com o mocassim sem meia usado pelo músico brasileiro, outra “prova inconteste” de sua conversão à cultura americana. A MANmagazine procurou Tinhorão para saber sua opinião sobre os 50 anos do primeiro disco de Tom nos Estados Unidos. Aos 85 anos, o crítico anda tão ranzinza quanto antes – e não mudou, em nada, sua opinião sobre o maior compositor brasileiro de todos os tempos. “Meu filho, por que você acha que Sinatra quis gravar um disco com Tom Jobim? Simples: porque o que o Tom fazia era jazz. Ou você acha que o Sinatra convidaria a Clementina de Jesus para gravar um disco em parceria?”, resmunga Tinhorão. Jobim costumava se vingar de Tinhorão à sua maneira, aproveitando a imensa fauna à disposição na casa, nos altos do Jardim Botânico, cercada pelos mais variados tipos de vegetação, inclusive por uma planta famosa pela beleza de suas grandes folhas, batizada pelos botânicos de “Tinhorão”, que Jobim fazia questão de regar de um jeito diferente, dispensando os serviços do jardineiro. “O meu último xixi do dia é sempre no Tinhorão”, dizia, nas entrevistas. Tinhorão nunca foi páreo para Jobim, mas o Brasil nunca o acolheu da maneira que ele merecia, o que talvez o tenha motivado a dizer que morar nos Estados Unidos era bom, mas uma merda... O que pouco se sabe é que a música composta por Tom Jobim era muito mais popular, mais palatável ao gosto comum do que se imagina, e ele poderia,
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FOTO: REPRODUÇÃO REVISTA MANCHETE
Cena do filme Copacabana Palace, com Luís Bonfá, Glória Paul, Sylvia Koscina, João Gilberto, Tom Jobim e Mylene Demongeot, (esq.); e parceria com Sinatra colocou a bossa nova na rota dos músicos americanos (dir.)
Até a turma da bossa nova, companheira de tantas jornadas musicais, começou a pegar no pé de Tom Jobim por ar tanto tempo em território americano
portanto, se as gravadoras brasileiras permitissem, viver de música apenas no Brasil. Uma prova disso são as dezenas de canções compostas por ele e que fizeram parte de trilhas de novelas. Foi assistindo aos folhetins da TV Globo que uma garota de Alto Garças, no Mato Grosso, se apaixonou por Tom Jobim no começo dos anos 1980 e 30 anos depois, já consagrada como Vanessa da Mata, foi convidada para fazer um show apenas com canções do autor de “Wave”. “Para mim, Tom Jobim sempre foi pop. E o que mais me intriga é um artista tão brasileiro, que se identifica tanto com o seu país, ser acusado justamente do contrário. O Brasil tem dessas coisas, né?”, diz Vanessa. <
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Na estrada
MI ARGENTINA QUERIDA Há 15 anos, caminhões Volkswagen circulam pelas carreteras argentinas, fazendo girar uma das economias mais promissoras da América Latina Por Marina Mota Fotos Mariana David
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Na guerra para estar nas gôndolas e balcões antes da concorrência, vale apostar na agilidade de veículos talhados para uma rotina estressante >>> Grãos, carnes, turismo, automóveis. Parece que a economia argentina pegou embalo em 2013. Apesar das controvérsias entre os números oficiais e o que é de fato percebido por vários setores da atividade econômica, a perspectiva de crescimento merece crédito. É o que explica o aumento da produção interna e das importações, sobretudo de veículos. E, já que uma coisa leva a outra, mais consumo traz mais investimento, que chama por mais produção, por maior capacidade instalada e, de novo, por mais mercado, mais escala, num efeito ciranda que parece estar apenas começando. Nessa velocidade, as empresas que mantêm o termômetro na temperatura do varejo aceleram o o. Quem ar de madrugada pela garagem da transportadora Geocargo, em Tigre, região metropolitana de Buenos Aires, vai ficar impressionado com o entra e sai de caminhões. O trabalho nessa distribuidora da Coca-Cola pega fogo antes mesmo das três da manhã. Em geral são caminhões deixando a garagem às
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margens do delta do rio Paraná com destino à capital para pegar a carga de bebidas em grandes centros de distribuição. A corrida leva meia hora, se muito. De lá a frota retorna a Tigre para distribuir a mercadoria em 2.700 pontos de venda, como quiosques, lojas de conveniência, restaurantes e padarias. Na guerra para estar em gôndolas e balcões antes da concorrência, vale apostar na agilidade de veículos talhados para uma rotina estressante. Para aguentar o vaivém entre fornecedor e clientes, é preciso boa dose de robustez. “Necessito de um caminhão que resista a abrir e fechar a porta cem vezes ao dia”, explica Cesar Krompolcas, sócio e gerente da Geocargo. Mecânica e bom valor de revenda foram os dois fatores que levaram o empresário a optar por caminhões Volkswagen para a toda a sua frota de 13 veículos, modelos Worker 13.180 e 17.220, há quase dez anos, quando a empresa ou por uma reformulação. “Meu negócio é vender bebida e não caminhão. Na Volkswagen, pagam melhor no meu usado e oferecem
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vantagens para renovar a frota”, disse Krompolcas, cliente da concessionária Andecam, na Grande Buenos Aires. Com cerca de 400 mil habitantes, Tigre tem a cara do novo momento da economia argentina. É a cidade que mais cresce no país, de acordo com o censo de 2010. Por ali, espalham-se condomínios de luxo (conhecidos na Argentina como countries) e casas de veraneio, onde algumas vezes só é possível chegar de barco. Rota preferencial de turistas que querem conhecer os arredores de Buenos Aires, a cidade tornou-se famosa por atrações como o Mercado de Frutos e o delta do Paraná. É a logística em torno do varejo dinâmico das grandes e médias cidades argentinas, como Tigre, que justifica o ritmo acelerado dos pesados Volkswagen. Há 15 anos no mercado, a MAN Latin America coleciona clientes satisfeitos, como a Geocargo e a Transportes Masotta. A segunda é responsável por abastecer as lojas do Carrefour, uma das principais redes de supermercados presentes no país. Em 2004, a empresa comprou os primeiros veículos da marca e hoje metade da frota de 48 caminhões é da montadora. “Resolvemos testar os veículos por conta do bom atendimento e das facilidades de compra. O desempenho e a manutenção nos levaram a comprar mais”, justifica Walter Masotta, um dos donos da transportadora.
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Para abastecer mais de 2.700 pontos, o trabalho na Geocargo, distribuidora da Coca-Cola, começa logo cedo (abaixo). Em Buenos Aires, a Transportes Masotta é responsável pelas entregas das lojas Carrefour e precisa seguir à risca a legislação para circular pelo centro da cidade
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Os caminhões são carregados durante a noite nos centros de distribuição em cidades da região metropolitana de Buenos Aires, como Estevam Echeverria, Malvinas Argentinas e La Matanza, e, a partir das seis da manhã, dão início às entregas, principalmente na capital. Para o transporte urbano, a opção é pelos modelos Worker 13.180 e 17.220, que carregam cerca de 12 toneladas e fazem de duas a três viagens por dia. Transportam de eletrodomésticos a itens da cesta básica dos argentinos, incluindo aí delícias típicas como doce de leite, alfajor e erva-mate. A empresa dispõe de caminhões refrigerados para distribuir também um dos maiores orgulhos da mesa nacional: a carne. Num país onde o consumo de carne bovina é de cerca de 62 quilos por habitante/ ano – bem acima da média brasileira, que não chega a 40 quilos –, ter o produto na hora certa e na condição de consumo ideal faz toda a diferença.
Como em todas as grandes cidades do mundo, Buenos Aires também restringe o trânsito de caminhões. Os veículos com mais de 12 toneladas não circulam nas avenidas que fazem parte da chamada “rede de trânsito pesado”. Nos feriados prolongados, as restrições são ampliadas para as vias de entrada e saída da cidade. DAS PROVÍNCIAS AOS ANDES Nas viagens de longa distância, os caminhões chegam a levar até 20 toneladas de carga, em uma ou duas viagens semanais, segundo Masotta. Os modelos usados são o Constellation 17.250 e o 19.320. A maior rota da empresa, com cerca de 1.700 quilômetros, é a que vai da capital a Bariloche, na região dos Andes da Patagônia argentina e principal centro turístico do país para a prática de esqui. A viagem pode levar até três dias, sendo 24 horas de direção, divididas em trechos de no máximo oito a nove horas diárias, já que os caminhoneiros viajam sozinhos. No trajeto de pouco mais de 1.100 quilômetros até a cidade de Neuquén – capital da província de mesmo nome –, a estrada é plana e pouco sinuosa.
O clima frio e a neve pedem atenção redobrada dos motoristas, principalmente na região da cordilheira dos Andes, onde as estradas são mais sinuosas
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PELOS VINHEDOS São comuns os caminhões na paisagem dos principais vinhedos, na região do Cuyo no oeste do país, cuja cidade mais conhecida é Mendoza. Na tradicional Bodega Los Toneles, de 1922, toda a frota de cerca de 120 caminhões é da Volkswagen. Na época da colheita, nos meses de março e abril, são 15 veículos da marca que levam as uvas desde os vinhedos até a vinícola, percorrendo distâncias que vão de 50 a 200 quilômetros. Depois da fermentação e do envelhecimento em tonéis de carvalho, chega a hora de a própria empresa fazer a distribuição dos vinhos já engarrafados. A vinícola produz vinhos premiados, como o Tonel 46 malbec – vencedor de sete prêmios, dentre eles, o China Awards na categoria de melhor vinho argentino. Para manter as características dos vinhos, o cuidado com a logística é extremo. Por isso, a empresa opta por fazer a distribuição e utiliza caminhões com baús térmicos. “O transporte é feito principalmente à noite, para manter a tempe-
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Na época da colheita, os caminhões da Bodega Los Toneles carregam as uvas in natura. Depois de meses de envelhecimento em tonéis de carvalho, a empresa assume a distribuição dos vinhos já engarrafados
ratura e impedir que a ação dos raios solares altere a qualidade dos vinhos”, explica Jose Millan, dono da Bodega. Os veículos da frota levam as garrafas para diversas regiões argentinas, sobretudo Buenos Aires, maior centro consumidor do país. A região produtora é distante das zonas de consumo. Assim como as estradas do nordeste argentino, as do oeste também são bem diferentes das autopistas das regiões mais povoadas e, além disso, o relevo não é plano. Parte da carga chega à região sul do Brasil e ao Paraguai. Segundo Millan, a empresa começou a comprar os veículos Volkswagen em 1998, ano de entrada de caminhões da marca na Argentina, e, cinco anos depois, já havia renovado toda a frota. A opção se deve à resistência mecânica e à atenção na venda e pós-venda por parte da concessionária em Mendoza, a Yacopini.
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Mas desse ponto até Bariloche a viagem se torna mais difícil, com trechos montanhosos, pelas encostas dos Andes. Outro desafio é o clima frio. “Muitas vezes os motoristas enfrentam gelo e neve na estrada. Por isso, optamos por não fazer esse percurso no inverno, quando as condições climáticas são ainda piores”, explica Masotta. Na estrada há 26 anos e há dois trabalhando para a Transportes Masotta, o caminhoneiro Victor Ávila, 50 anos, viaja semanalmente em um Volkswagen Constellation 17.250 para províncias do nordeste da Argentina como Corrientes, Chaco e Formosa, levando, por vez, cerca de 16 toneladas de carga para as lojas do Carrefour. “As estradas da região, no geral, não são duplicadas e têm muito tráfego de caminhões. Por isso, preciso dirigir sempre na defensiva”, conta Ávila. Segundo ele, a qualidade de conservação muitas vezes também deixa a desejar. A Argentina tem mais de 231 mil quilômetros de vias, sendo apenas 69 mil quilômetros pavimentados.
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Com o aquecimento da indústria automobilística argentina, a Trans Tony, especializada no transporte de autopeças, já planeja expansão dos negócios
A Argentina é o quinto maior produtor mundial de vinhos, com 25 mil vinhedos e quase mil vinícolas. No último agosto, foi promulgada uma lei que declarou o vinho argentino “bebida nacional”. O consumo per capita é de 26 litros por habitante/ano, enquanto no Brasil não a de dois litros anuais por habitante. UM POUCO DE HISTÓRIA Com mais de 15 anos em atuação em serviços logísticos, a Trans Tony tem como principal negócio transportar autopeças para indústrias de automóvel. A empresa ou a comprar caminhões Volkswagen em 2004, num momento de expansão da empresa, e hoje 35 caminhões da frota de 50 veículos são Constellation 17.250. O recente aquecimento do setor automobilístico no país já coloca nos planos do empresário Eduardo De Vincenti uma nova expansão. “Vamos construir um depósito logístico e aumentar a frota para atender à demanda das montadoras na região”, afirma. O crescimento da produção de veículos na Argentina foi de 12%, de janeiro a agosto deste ano, o que alavancou todo o setor industrial, motivado principalmente pela demanda brasileira de automóveis, para onde vai cerca de metade da fabricação, da ordem de 800 mil veículos por ano. Embora com a população cinco vezes menor que a brasileira, a Argentina é proporcionalmente um país mais motorizado: são 2,7 milhões de veículos comerciais em circulação, ante 7,2 milhões rodando no
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Brasil. O país conta com 8,3 milhões de automóveis particulares, ou um para cinco habitantes; enquanto no Brasil existem 27,4 milhões de carros em circulação, ou um para sete habitantes. A principal rota da Trans Tony é a que vai de Buenos Aires a Córdoba, percorrendo cerca de 700 quilômetros. A viagem, que começa em rodovia nova e duplicada, requer mais atenção a partir de Rosário, a cerca de 300 quilômetros de Buenos Aires, em razão da grande quantidade de veículos de carga pesada até Córdoba e das mudanças de relevo. Com 1,5 milhão de habitantes, Córdoba é um polo industrial do setor automotivo, um dos mais dinâmicos da economia argentina e que responde por 40% do intercâmbio comercial com o Brasil. Por causa do relevo montanhoso e da herança colonial – seu conjunto de igrejas jesuítas foi tombado pela Unesco como patrimônio da humanidade –, Córdoba é chamada por argentinos conhecedores do Brasil de Minas Gerais argentina. As terras altas da cidade fizeram com que a família do revolucionário Ernesto “Che” Guevara optasse por viver na cidade de Alta Gracia, próxima à capital regional, para atenuar as frequentes crises de asma de “Che”, quando criança. Para lidar com os riscos da estrada, a empresa realiza capacitações regulares em direção defensiva – são quatro por ano – e mantém um comitê de segurança. A jornada nesse caso é de no máximo 12 horas de direção, seguida de 12 horas de descanso, de acordo com o limite previsto na legislação argentina. “Enquanto os motoristas que viajaram descansam, outros trabalham na distribuição das peças na cidade”, explica De Vincenti. TRÂNSITO URBANO O desafio é outro para a distribuidora de gás City Gas, na Grande Buenos Aires. Os motoristas não percorrem distâncias longas, mas uma grande gama de cidades na região metropolitana da capital, que reúne 14 milhões de habitantes. Enfrentam muitas vezes ruas pequenas, sem asfalto, e áreas rurais com o difícil, levando botijões.
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A empresa tem 40 anos. Em 2000, começou a comprar caminhões da Volkswagen e atualmente a maior parte da frota de 45 veículos é da marca. O modelo usado é o Delivery 8.150. “É um veículo que atende bem à nossa necessidade, ideal para o nosso trabalho, que exige uso muito intenso”, explica o dono da empresa, Javier Azar. O “uso muito intenso” pode ser traduzido pela distância percorrida em um ano pelos trabalhadores da empresa: 1,5 milhão de quilômetros, para cerca de 200 mil entregas domiciliares, 700 mil visitas a clientes comerciais e 18 mil a clientes industriais. “A renovação de frota precisa ser constante”, diz Azar. De janeiro a agosto deste ano, as vendas de veículos de carga MAN aumentaram no país 23%, em relação ao mesmo período do ano ado. A MAN acaba de lançar novos produtos na Argentina, como o TGX 28.440 6x2, um caminhão de carga pesada já comercializado no Brasil, origem de todos os caminhões importados pela Argentina. A Man Latin America também comercializa ônibus na Argentina, como o modelo VW 18.320 EOT em versão fretamento, escolhido pela Asociación del Fútbol Argentino (AFA) para levar os jogadores da seleção aos jogos em território nacional.<
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Circulando pela Grande Buenos Aires, a frota da City Gas percorre curtas distâncias, mas enfrenta ruas sem asfalto e áreas de difícil o
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cultura
ALEMANHA SOBRE RODAS Caminhão equipado com atrações culturais vai percorrer 17 cidades brasileiras até 2014 Texto Mariana Filgueiras
>>> Um caminhão pode levar frutas pelo Brasil, transportar animais, combustível, água a regiões áridas, remédios a cidades do interior. Um caminhão pode fazer mudanças, carregar de um lado para o outro equipamentos industriais, flores, documentos, material de construção e o que mais couber na carroceria. Um caminhão pode transportar até cultura. É o que faz o Volkswagen Constellation 19.390, com 15 metros de carroceria, fabricado pela MAN Latin America. Desde o último dia 13 de maio, o caminhão é o veículo da Kultur Tour, uma espécie de turnê cultural apoiada pelo governo alemão, em parceria com a Man Latin America, a Volkswagen do Brasil e o Banco Volkswagen, que até maio de 2014 terá percorrido 17 cidades brasileiras promovendo a cultura germânica pelo país. A Kultur Tour é um dos destaques da programação do projeto “Alemanha + Brasil 2013/2014:
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quando ideias se encontram”, realizado pelo Ministério das Relações Exteriores da Alemanha em conjunto com o Instituto Goethe. O objetivo é estreitar a relação entre os dois países e mostrar a faceta artística e dinâmica da cultura germânica em áreas como música, literatura, meio ambiente, economia, tecnologia, educação, ciências, entre outras. Para atrair o maior número de visitantes possível, o caminhão estaciona em praça pública ou algum outro lugar com vasta circulação de pessoas. Com nove profissionais, sendo oito alemães, abrem o palco retrátil, que transforma o caminhão em uma espécie de usina cultural. Todo grafitado por dois artistas plásticos (o brasileiro Carlos Dias e o alemão Jim Avignon), o veículo não a despercebido. É só chegar e aproveitar a programação gratuita: são oficinas de teatro, música ao vivo, biblioteca, instalações de arte, jogos e contação de histórias.
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Música, arte, cinema, literatura. Cabe de tudo na caçamba do Constellation, preparado para levar a cultura alemã aos brasileiros
“O resultado é excelente. As pessoas são atraídas pela curiosidade que a cultura germânica desperta. Chegam aqui, pegam um livro, descobrem uma palavra nova, querem saber que música está tocando, assistem às peças de teatro”, comenta o produtor cultural Holger Beier, curador do projeto. “E não estamos só trazendo ícones da cultura clássica alemã, não. Há muita coisa contemporânea também, principalmente em relação a música, literatura e cinema.” BIENAL DO LIVRO A Kultur Tour já ou por cidades como Vinhedo, em São Paulo, Londrina, no Paraná, e Três de Maio, no Rio Grande do Sul. Em setembro marcou presença na Bienal do Livro, no Rio de Janeiro. Em meio a estandes e atrações da maior feira de livros da America Latina, lá estava Holger, entre oito instrutores culturais alemães, divulgando a cultura do país aos brasileiros. “Fazemos muito sucesso principalmente com as crianças”, comemora Holger, lembrando que o fato de o caminhão ficar estacionado sempre ao ar livre dá um caráter circense à atração, o que chama muito a atenção dos pequenos. Naquela tarde de sábado, por exemplo, quem estava na Bienal teve a chance de assistir à sessão de cinema ao ar livre com curtas-metragens sobre sustentabilidade, arte urbana e futebol; à exposição “Alemanha na Mala”, sobre expressões básicas do idioma alemão,
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com jogos interativos, trechos de filmes e poemas que facilitam a compreensão da língua; também puderam ter o a mais de mil livros na sala de leitura montada com pufes e mesas dentro do caminhão. Era lá que estavam as estudantes Bianca Bento Lebre e Lidiane Dias Sella, ambas de 15 anos, que deram uma escapada da visita oficial que fizeram com a escola à Bienal para explorar o caminhão colorido da Kultur Tour. “Eu aprendi que a maioria dos contos de fadas que conhecemos na infância é de escritores alemães, não sabia disso”, observa Bianca, antes de colocar um fone de ouvido e aprender algumas palavras de saudação na língua dos Irmãos Grimm. Lidiane gostou da seleção de músicas que o DJ Thomas Haferlach montou, intercalando hits contemporâneos brasileiros e alemães. “Acho que é a primeira vez que estou ouvindo um hip hop alemão!”, espantou-se a menina, que itiu que os jovens de sua idade conhecem muito pouco a cultura germânica atual. “Trabalho em oficinas de arte e educação há muito tempo e confio muito no poder de conexão cultural que a música desperta. O futebol também. Juntando as duas coisas, criei essa instalação, que chama muita atenção pelos mecanismos simples de funcionamento”, diz o artista plástico Carsten Galle, criador da instalação a “Bola de Futebol Musical”, que dependendo do lance toca uma canção.<
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Viagem
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A VOLTA POR CIMA Exatamente 30 anos depois de uma devastadora enchente, Blumenau mostra que superação é uma das especialidades da terra, assim como a boa cerveja e o faro para negócios duradouros Por Raquel Alves Fotos Zé Paiva
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>>> Todo brasileiro deveria ter orgulho e até uma invejinha boa de Blumenau. A cidade catarinense que se espalha em construções enxaimel ao longo do rio Itajaí Açu está no primeiro pelotão entre os municípios brasileiros com maior expectativa de vida, segundo o IDH-M. Ali nasceram e prosperam grandes marcas brasileiras, como a Cia. Hering, e pelas ruas arborizadas anda um povo elegante, de olhos azuis e sobrenomes cheios de consoantes. A cidade é também ponto de partida da mais charmosa rota da cerveja. Mas talvez a capacidade de superação seja a mais importante característica de sua gente. Basta ver a história: devastada por uma enchente que durou 32 dias, chegou à copa das árvores e varreu a cidade com violência em 1983, Blumenau arregaçou as mangas e trabalhou duro. Para levantar o ânimo geral, já no ano seguinte lançou a primeira edição de sua Oktoberfest.
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Famílias alemãs reviraram seus baús em busca de objetos, referências e histórias para remontar a música, a dança, as bandas, os quitutes típicos trazidos pelos primeiros imigrantes. Inspirada no grande festival de Munique, a festança voltou no ano seguinte com mais desfiles pela cidade, mais música, mais chopp e o dobro de convidados. Em pouco tempo, virou mania nacional. A Oktoberfest não só ensinou a lavar a alma em grande estilo, como deu projeção turística à região. Num eio pela cidade, MANmagazine constatou que, muito mais que um festejo, Oktoberfest é o jeito de viver e ser da cidade o ano inteiro. O tour tem ponto certo para começar, a Vila Germânica. O espaço pega fogo no mês de outubro e se mantém ativo em boa parte do ano, recebendo eventos e feiras locais. O o aos grandes pavilhões, uma
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Caminhão Rodalog na entrada da Vila Germânica, à esquerda. Nesta página, o marreco recheado, carro-chefe no cardápio alemão
réplica de uma típica rua de Munique, não para nunca, vendendo comida típica, cervejas artesanais, conservas, suvenires e roupas do Fritz e da Frida, como são chamados os mascotes do folclore alemão. Quem quiser um modelito mais customizado basta atravessar a rua e encomendar no ateliê da dona Odete. Mas isso de novembro a março. Nos demais meses 100% da produção é dedicada à Oktoberfest, já que 25% dos convivas fazem questão de comparecer a caráter. No ateliê seis costureiras dão duro em jornadas que vão até tarde da noite. “Comecei com as roupas da rainha e da princesa. Depois vieram as bandas, os grupos folclóricos, hoje é o grande público quem compra quase toda a produção”, contabiliza Odete Cugik, uma descendente de poloneses que se recusa a dar números, mas garante que também manda suas roupas para todo o Brasil e também exterior. VAIVÉM DOS PESADOS O movimento de caminhões também é constante na Vila Germânica. Durante a festa uma logística bem azeitada mantém os pavilhões abastecidos com comida fresca e bebida gelada. A Rodalog conhece bem a operação em torno do espaço. Parceira da Ambev no transporte de bebidas, a empresa faz o corre-corre entre a fábrica da cervejaria, em Lages, o centro de distribuição da Ambev, em Blumenau, e a entrega em pontos de venda por todo o Vale do Itajaí. Na época da festa, para que nenhum visitante fique sem encher a caneca, a Rodalog opera com dois caminhões-tanque da Ambev, iguais aos que transportam gasolina, com capacidade entre 8 e 20 mil litros de chopp. Como o consumo em toda cidade aumenta na temporada da Oktoberfest, os 13 caminhões da
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Choppmotorrad, criação de Ingo Penz, virou nome de banda, disco, DVD, festa e um show de alegria que encanta o sul brasileiro
Rodalog também não param. Dois novos VW 24.220 foram adquiridos neste ano para dar conta do pico no consumo. “No período de alto volume operamos com 22 caminhões”, calcula Paulo Afonso Prebianca, gerente da Rodalog, que responde pela operação no centro da Ambev. Os veículos transportam em média 3 milhões de litros/mês, considerando cerveja, refrigerante e afins, embalagens descartáveis e retornáveis. Isso equivale a aproximadamente 230 mil engradados de cerveja. Haja caneco! A festa que resgatou a autoestima da cidade acrescentou mais sabor às mesas dos restaurantes, afinal, embutidos e defumados não podem faltar no carnaval alemão. O sabor da Oktoberfest consolidou o nome de frigoríficos, como o Olho, o Ipom e o Villa Germania, especializado na produção de aves, que tem como carro-chefe o marreco recheado.
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Rótulos de cervejas e refrescos da fábrica dos Feldmann sobrevivem nas lembranças e no quadro de dona Ella. Na página ao lado, Fábio Steinbach, mestre cervejeiro da Wunder Bier
A empresa de pouco mais de 15 anos exporta para 22 países parte da produção diária de 8 mil aves. Só para atender à Oktoberfest deste ano, Roberval Zimmermann, gerente de vendas, solicitou um extra de 250 toneladas de aves. Isso sem contar a quantidade de hambúrgueres de pato e marreco, uma criação do fabricante especialmente para a festa. LOIRA E GELADA Um pouco pela herança genética e muito por influência da festa, a cultura cervejeira está instalada entre os blumenauenses. Isso explica por que nos pavilhões marcas consagradas como Brahma, Bohe-
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mia e Stela Artois convivem pacificamente com as cervejarias locais, como Wunder, Das Bier, Eisenbahn e outras que seguem à risca a lei de pureza alemã. Na cidade que tem um museu dedicado à bebida, todo mundo entende um pouco do assunto: do processo de fabricação às variedades de aromas e sabores. “Não faz muito tempo, as famílias tinham suas próprias cervejarias em casa. Agora a nova geração está redescobrindo as as e as ferramentas, e o hábito de fabricar em pequena escala está voltando,” analisa o mestre-cervejeiro Fábio Steinbach, bisneto de alemães e autodidata no tema. No bairro de Itoupava, a porção mais alemã de Blumenau, a antiga sede da cervejaria Feldman, uma das pioneiras, foi transformada em oficina de cultura. Nem por isso a família arredou pé. No mesmo terreno, a casa de madeira da dona Ella Feldman segue firme, emprestando um clima ainda mais bucólico à paisagem. Aos 80 anos, a brasileira dona Ella conta, num português impregnado de sotaque, que divide os amplos cômodos com os dois filhos adultos. Há muito a família deixou de produzir cervejas e refrescos, a fábrica foi varrida pela onda das grandes indústrias. Mas aqui e ali ainda se pode encontrar vestígios dos bons tempos, como uma máquina de rolhar garrafas e um quadro com os rótulos das bebidas produzidas pelos Feldman, que dona Ella exibe com orgulho. ESQUENTA Ainda que outubro seja o mês oficial, eventos menores dedicados à arte de fabricar, degustar e até mesmo consumir cerveja em grande escala pipocam o ano todo. Antes de a primavera raiar já tem o festival dos botecos e na sequência o agito liderado por um dos personagens mais emblemáticos da festa, o fotógrafo, músico, escritor e figuraça Ingo Penz.
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“Não faz muito tempo, as famílias tinham suas próprias cervejarias em casa. Agora a nova geração está redescobrindo o ferramental e o hábito de fabricar em pequena escala”, analisa Fábio Steinbach
Gente da terra Jean Zonta, proprietário da W. Breitkopf Caminhões e Ônibus de Blumenau dá a dica: O MELHOR PÔR DE SOL: Na Avenida Presidente Castelo Branco, mais conhecida como Beira-Rio, com a Ponte de Ferro ao fundo. O reflexo do sol sobre o rio é lindo. O MELHOR STRUDEL : Confeitaria Cafehaus Glória, na rua Sete de Setembro, 1213, Centro. Não esquecer de pedir o creme (nata) para acompanhar. O MELHOR CHOPP: Indico três lugares: EISENBAHN, rua Bahia, 5181, Salto Weissbach, onde é possível fazer uma degustação que inclui canapé com linguiça Blumenau, que é ótima. BIERLAND, rua Gustavo Zimmermann, 5361, Itoupava Central. DAS BIER, na vizinha Gaspar, rua Bonifácio Haendchen, 5311, Belchior Alto. A MELHOR ÉPOCA PARA VISITAR A CIDADE: Setembro tem clima agradável e a cidade anda no seu ritmo normal. Em outubro você verá o agito e a decoração para a Oktoberfest. O QUE SÓ TEM EM BLUMENAU: As delícias ale-
Ele organiza anualmente a Choppmotorrad Fest, uma espécie de “esquenta” da Oktoberfest, que já está na quarta edição e atrai visitantes das cidades vizinhas e até de outros estados. Isso porque Penz – que também é um promotor da cultura cervejeira alemã – é a versão melhorada e motorizada de um abre-alas. Todos os anos ele e sua moto saem distribuindo chopp e simpatia nos desfiles oficiais da festa. Ficou tão popular que acabou levando seus barris e sua alegria para todo o sul brasileiro e até numa festa alemã em Córdoba, na Argentina. Além de outros eventos ligados à gastronomia e à cultura alemãs, Penz lidera uma banda com o mesmo nome complicado de seu festival. A Choppmotorrad reúne músicos de várias gerações, tem repertório alemão de raiz e transforma qualquer encontro num festão, exatamente como manda a tradição de Blumenau. <
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mãs do Restaurante Moinho do Vale, rua Porto Rico, 66, Ponta Aguda. Outra opção é o Abendbrothaus, rua Henrique Conrad, 1194. Josefa Jensen lidera uma brigada que prepara o único prato servido na casa de nome alemão, estilo enxaimel e cozinha de forte sotaque germânico: o marreco recheado. É servido com chucrute, repolho roxo, aipim frito com bacon, purê e salada de batata, mais um delicado e saboroso purê de maçã - a fórmula é secreta, não insista. Apenas nos almoços de domingo e com reserva. PARA JOVENS: The Basement Pub, rua Paul Hering, 35, Centro) funciona no porão de um prédio tombado pelo patrimônio histórico. É um pub que, além da boa carta de cervejas, vinhos e destilados, oferece uma gastronomia bem executada.
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Movimentos da rua Itupava: acima à direita, a vitrine onde tudo começou. À esquerda, o charme da Cantina do Délio; o Colégio Positivo (abaixo) e a fachada florida do restaurante preferido da atriz
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PONTO CHIC Adriana Birolli descobriu os encantos da rua Itupava através da vitrine da Garota Chic. E ou muitas tardes na pracinha em frente ao colégio onde estudava, apreciando o vaivém curitibano Por Adriana Birolli Fotos Gilson Abreu
>>> Das muitas lembranças que trago da minha infância em Curitiba, a rua Itupava ocupa um cantinho especial. A minha história de amor com essa rua começou com a loja de roupas infantis da minha mãe, a Garota Chic, que fica no PolloShop. >>> Quando o movimento apertava, eu corria lá para ajudar a atender os clientes. Até recentemente, quando estive em Curitiba, participei de um mutirão da família, com meu pai no comando, para reformar o espaço. O trabalho rolou a madrugada inteira porque a loja fica dentro de um shopping e não pode ar por serviços durante o dia. >>> Logo ao lado do shopping há um restaurante incrível, a Cantina do Délio, uma construção de madeira cheia de antiguidades. O cardápio é delicioso e o atendimento de primeira, com direito sempre à visita do chef à mesa. Já beirando o Jardim Ambiental, uma sequência de praças onde ei muitas tardes fazendo trabalhos da escola e me divertindo com os amigos do Positivo, onde fiz o ensino médio. >>> Na frente do colégio, não poderia faltar a Padoka, onde praticamente todos os dias tomávamos nosso café da manhã, à base de pão de queijo e refrigerante. Boas recordações de uma época áurea da vida! Sempre que o por ali me lembro de tudo isso com muitas saudades.<
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A CAMINHO DE SHANGRI-LÁ Rasgar o norte da Índia e vencer 4 mil mil metros de altitude do Himalaia de ônibus, para o encontro sagrado com o Dalai Lama. Só mesmo no diário de Arthur Veríssimo, o jornalista-explorador-místico, poderia caber uma viagem tão cheia de descobertas. Pegue carona nesta aventura Por Arthur Veríssimo Ilustração Catarina Bessell
>>> Chegar à paisagem lunar de Spiti, Índia, já era uma conquista e tanto. Isolada do mundo por séculos, a região tinha sido aberta ao turismo há menos de três anos e lá estava eu, em uma missão peregrina no meio do povo budista e cercado por dezenas de monastérios e stupas (monumento budista) espalhados pelo vale. No ado, Spiti já fez parte do Tibete. Hoje, encontra-se na fronteira com a China, no estado indiano de Himachal Pradesh. A região é conhecida como Trans-Himalaia, e seus vilarejos encontram-se entre 3 mil e 4.500 metros de altitude. A odisseia até o enigmático Vale de Spiti foi uma experiência surreal em que realizei no ano de 1996. Primeiro foi necessário obter uma permissão em Nova Delhi. Durante os dias em que aguardei a autorização (burocracia indiana) pesquisava de qual forma iria ao Shangri-lá. Alugar um veículo estava fora do meu orçamento. A única possibilidade seria viajar de ônibus, rasgando o norte da Índia. Meu ponto de partida era a caótica estação de Nova Delhi, um mar de plataformas, gente e ônibus de todos os estilos, dos sofisticados double-decks até as inseguras jardineiras. Embarquei em um busão, digamos, decente, sem muita firula, mas com certo padrão de conforto e seguimos por uns 400 quilômetros até Simla.
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Em Simla, ex-capital de verão dos vice-reis britânicos, troquei de ônibus, por um modelo bem mais despojado e muito mais lotado de gente e levamos mais de um dia de viagem para chegar ao destino. Meu objetivo seria acompanhar a comemoração dos mil anos do monastério de Tabo e participar da celebração do Kalachakra, a mais alta iniciação do budismo tibetano aberta ao público. O complexo ritual seria ministrado por nada mais nada menos que Sua Santidade O 14 Dalai-Lama, Tenzin Gyatso. O busão parecia gemer a cada curva fechada da Hindustan-Tibetan Road. A rodovia, extremamente perigosa, foi construída em 1962, na época da guerra indochinesa. É uma autêntica obra-prima da engenharia. Serpenteamos durante dois dias as encostas e os contrafortes do Himalaia. Da janela podia ver montanhas e vales, que se assemelhavam ao cenário lunar. A paisagem é de uma solidão absoluta. Assim que entramos no vale de Spiti o sufoco diminuiu.
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Ao longo da estrada centenas de barracas e milhares de pessoas peregrinando. Quando chegamos ao monastério meu espírito apaziguou e entrei na atmosfera do Kalachakra. O complexo monástico, construído em 996, consiste de nove templos rodeados por montanhas e cavernas que já serviram de moradia para monges e peregrinos. Recordo-me que a falta de tibetanos entristeceu o Dalai Lama. Dezenas de milhares foram barrados na fronteira entre Índia e China. No vilarejo, a segurança em torno do Dalai Lama era rigorosa. Milhares de militares indianos estavam de prontidão com fuzis, metralhadoras, tanques e helicópteros. Mesmo com tanta paranoia bélica, o Kalachakra rolou na tranquilidade. O ritual, consiste no mito do Eterno Retorno, que direciona os pensamentos da humanidade para um futuro inspirador, sem guerras, degenerações e um contínuo esforço para a paz. Os textos do Kalachakra foram redigidos numa linguagem dificílima. Uma tarefa impossível é explicar o conteúdo dos rituais detalhadamente. No primeiro dia, assisti a diversas danças, do Ritual da Terra ao esboço do desenho de uma imensa mandala. Ela só foi construída pelos monges, a partir do quarto dia. No oitavo dia diversos grupos celebraram a dança das oferendas. No dia seguinte, sob uma imensa lua cheia, juntamente com peregrinos e leigos, fomos instruídos para as iniciações. O processo é multifacetado. Há uma distribuição de ervas e cordões abençoados. Com compaixão o Dalai Lama explicava pacientemente a forma de absorver os benefícios dos ensinamentos. Participei de diversos punjas (equivalente a missa) e da oferenda à Longa Vida. O grand finale foi exuberante. Tive o privilégio de uma audiência de 20 minutos com Sua Santidade O Dalai Lama, mas isso já outra história.<
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farol
ADEUS 2013. QUE VENHA 2014 Recentemente, realizei uma palestra para os executivos da MAN Latin America sobre o que acredito ser o ambiente econômico do Brasil em 2014 e nos próximos anos. Vamos a ela
Ricardo Amorim é economista, palestrante, apresentador do programa Manhattan Connection, colunista da revista IstoÉ e presidente da Ricam Consultoria (www.ricamconsultoria.com.br)
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FOTO: DANIEL ARATANGY
>>> Para começar prepare-se para mais um ano de baixo crescimento do PIB, provavelmente na faixa de 2% a 3%. Desde 2011, esgotaram-se dois fatores que permitiram o crescimento acelerado no período de 2004 a 2010: a incorporação de mão de obra ao mercado de trabalho e maior utilização de infraestrutura já existente. Como esse cenário não deve se repetir em 2014, o crescimento vai andar em ritmo lento. Quem sabe após as eleições, somente no final do próximo ano... Prepare-se também para um dólar em queda. Dificilmente, o Banco Central americano (Fed) terá condições de suspender os estímulos monetários nos próximos trimestres. Enquanto o Fed continuar a aumentar a oferta de dólares no mundo, a moeda só perderá valor. Aliás, as perspectivas para o euro, o iene, o franco suíço e a libra esterlina são parecidas. A inflação deve continuar pressionada, exigindo altas adicionais da taxa de juros, porém, como a inadimplência parou de subir e até parece estar caindo e o próprio BNDES deve continuar a ser capitalizado pelo governo, uma expansão da disponibilidade de crédito para o setor de caminhões e ônibus deve permitir que ele cresça mais do que o PIB em 2014, chegando possivelmente a taxas de dois dígitos. Outro fator a impulsionar o setor deve ser um crescimento mais acelerado no interior do país em função de boas perspectivas para o agronegócio. Sem uma expansão das malhas ferroviária e hidroviária a curto prazo, a única possibilidade logística para o interior do país é a rodoviária. Setores de serviços, comércio e imobiliário também devem superar o PIB. Por outro lado, pelo 11º ano consecutivo, a produção industrial deve ser menor do que as vendas no varejo. Enquanto não reduzirmos a carga tributária e os entraves a negócios, melhorarmos a infraestrutura e qualificarmos a mão de obra, o cenário não ará por grandes transformações. Que venha 2014.
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