Paul Rabinow Rabinow,
insere-se
na
corrente
pós-moderna
americana,
que
transformou a antropologia numa questão crítica cultural e de leitura intertextual, é, de certa forma uma maneira ultra-sofesticada de construção e de desconstrução das imagens dos textos. Uma primeira questão das evidências etnológicas surgiu com o americano Clifford Geertz, que elaborou nos anos 70 uma antropologia interpretativa. Ele define a cultura como uma entidade estilística e expressiva, como um sistema simbólico em acção. Como explica Paul Rabinow: «Partindo da ideia de que os indígenas produzem interpretações da sua própria experiência, a tarefa do antropólogo não é só a de compreender a maneira como dão forma às suas vidas (sempre no plural em Geertz), mas como problematizam essa formalização.» C. Geertz explica-nos que, na realidade, não é necessário opor a descrição em primeira pessoa à descrição em terceira pessoa ou, retomando uma distinção de psicanalista H. Kohut, os conceitos «próximos da experiência» e os conceitos «afastados da experiência». É necessário jogar nos dois campos para evitar cair no dialecto (do indígena) ou no calão (do erudito). Trata-se de compreender «…como, em cada um dos casos, se deve recorrer de forma a produzir uma interpretação do modo como o povo vive que esteja nem aprisionada no seu horizonte mental, uma etnografia da feitiçaria escrita por um feiticeiro, nem sistematicamente surda às tonalidades distintas da sua existência, uma etnografia da feitiçaria tal como um geómetro a escreveria» Paralelamente a essa nova teorização dos objectos antropológicos, desenvolve-se uma leitura, ou antes, uma releitura crítica dos textos etnológicos, inspirada na filosofia e na crítica literária sa, dita pósmoderna (R. Barthes, J.-F. Lyotard, J. Derridas). Reconhecendo a pluralidade das vozes na etnologia (também as dos antropólogos do países não ocidentais), colocando em causa a objectividade de todos os discursos sobre o Outro, esses investigadores propõem, primeiro de tudo, uma desconstrução dos métodos clássicos de representação na disciplina, uma vez que esta última é, implicitamente, e desde sempre, uma crítica cultural da sociedade
do próprio antropólogo. A antropologia deve desvelar as implicações históricas e políticas do seu projecto. Torna-se um projecto experimental. As aquisições dessa crítica pós-moderna merecem ser conhecidas, mesmo porque alguns desses trabalhos incidem sobre a etnologia sa. James Clifford oferecenos, assim, notáveis análises da obra de Maurice Leenhardt e de Marcel Griaule. No seu texto «Sobre a autoridade na etnografia», o antropólogo americano coloca uma questão essencial, de carácter político, epistemológico e prático: «Se o etnógrafo produz uma interpretação cultural, baseada numa experiência de investigação intensiva, como se transforma uma experiência desprovida de regras em discurso textual de autoridade? Mais precisamente, como é que um encontro verbal, subdeterminado, repleto de relações de poder e de interesses pessoais entrecruzados, poderá ser traduzido e circunscrito para se tornar na versão adequada de um “outro mundo”, mais ou menos discreto, composto por um actor individual?» (1983). A análise das estratégias textuais, das maneiras de escrever, de ler, de traduzir (em todas, o sentido do termo) o que os outros dizem ou nos dizem, e não apenas uma forma de crítica literária, da história das ideias, mas também uma sociologia do poder em acção: como ele compreende, interpreta e manipula as respostas para fins científicos, fins que são incompreensíveis (mas, de qualquer modo, valorizados) pelos seus interlocutores. Entretanto, à força de tanto trabalhar os estratagemas de produção dos «enunciados» e dos «discursos», esses críticos acabam por confundir o mundo real com o mundo dos textos. De facto, apenas o mundo dos textos seria real, uma vez que é o único que pode testemunhar esse encontro, essa escuta, esses diálogos. É por essa razão que Clifford distingue diferentes tipos de autoridade,
como
os
modos
experimental,
interpretativo,
dialógico,
polifónico. Esses modos são universais e não são, de forma alguma, um privilégio dos antropólogos ocidentais. Esse olhar pós-moderno tem mais a ver com gosto do que com escola, e não constitui senão uma tendência, certamente minoritária, da antropologia americana. A sua utilidade não é nunca colocada em causa se se item, à partida, os seus limites. É o que fazem aqueles que propõem recapturar a antropologia para a colocar no coração da história política e cultural mundial
(Fox, 1991). A antropologia não deve tornar-se uma exegese a falar unicamente de si própria. A antropologia e a etnologia fazem parte do tecido social a observar e a explicar. As utilizações, reformulações, assimilações «indígenas» dos conteúdos e dos «trabalhos» etnológicos, não são menos impuras que os trabalhos publicados pelas imprensas universitárias ou pelas Edições de CNRS. O discurso científico manifesta uma derradeira e última forma de objectivação das contradições sócias e culturais que fazem viver a antropologia. A corrente simbólica derivou na antropologia pós-moderna (Clifford Geertz, James Clifford, G. Marcus, M. Strather, R. Thornton; M. Fisher; D. Tedlock; K. Dwyer; P. Rabinow) a qual sofreu influência do pós-modernismo filosófico de Lyotard e tembem o pós-modernismo estruturalista. Segundo S. Tyler, em várias das suas publicações, o mundo pós-moderno é aquele desprovido
da
ilusão
transcendente,
é
um
mundo
fragmentado.
Independentemente das criticas que se podem fazer a esta visão de Tyler, a linha antropológica que desboca na antropologia pós-moderna é aquela que deriva da área da fenomenologia, da hermenêutica, a filosofia linguista e da simbologia interpretativa. Algumas das suas ideias centrais colocam ênfase na ideia da existência de uma realidade em si, só uma realidade interpretativa, o que por sua vês, a antropologia é uma interpretação de interpretações, ou seja, uma construção em segundo grau. A antropologia pós-moderna verificou de que o trabalho de campo e a etnografia era uma construção sistemática da visão do outro. Por tanto, o etnógrafo não seria um relatador fiel dos dados, mas antes um elaborador, um construtor e um criador. Esta linha antropológica defendeu a ideia de que por detrás
dos
antropólogos
havia
mecanismos
retóricos
de
“autor”
e
“autoridade”, e que a etnografia reproduz situações de subordinação perante o saber ao mesmo tempo que implica relações de poder. Afirma que a antropologia é um feito humano e ao mesmo tempo literário. Existem
correntes
dentro
da
antropologia
pós-moderna,
nomeadamente: •
A meta-antropologia, que realiza uma analise critica dos recursos retóricos e autoritários da antropologia convencional
praticada
pelo
“realismo
etnográfico”
(empirismo,
positivismo…) na busca de leis gerais; a meta-antropologia procede
à
desconstrução
práticas
e
desenvolve
novas
alternativas de investigação. Representativos desta linha de pensamento são alguns trabalhos dos seguintes autores: C. Geertz; G. Marcus; J. Clifford e M. Strathern. Segundo Marcus as críticas à antropologia tradicional seriam as seguintes: •
Estruturação das monografias como etnografia total.
•
Aparente presença não intrusiva do etnógrafo no texto.
•
Exclusividade dos informantes individuais e referencia a um sujeito colectivo homogéneo.
•
Ausência de narração do processo de trabalho de campo nas monografias.
•
Apresentação do material etnográfico como ponto de vista dos sujeitos culturais e ausência do ponto de vista do antropólogo.
•
Extrapolação estadística dos dados particulares.
•
Pratica de uma linguagem nativa.
Todas estas características da antropologia tradicional seriam utilizadas para convencer os leitores e a academia da verdade do que tinha sido investigado. •
A etnografia experimental tenta buscar alternativas de escrita etnográfica,
procura
uma
narrativa
personalizada
em
contraposição a algumas “descrições objectivas”. Nas suas obras integra-se o “outro” no discurso do antropólogo, e defende-se a ideia de interacção entre antropólogo-leitor e o informante. O autor renuncia em falar no lugar do “outro” e as pessoas detêm o direito à palavra e à voz. O leitor encontrará o seu caminho entre os contextos dos habitantes. Esta corrente escreve sobre as suas dúvidas relativas ao trabalho de campo e mostra a problemática do encontro com o “outro”. Outras das ideias centrais desta corrente são:
•
O
método
do
diálogo,
em
virtude
do
carácter
intersubjectivo do trabalho de campo. •
O inter-cruzamento de laços com os informantes (ligação privilegiada).
•
A heterogeneidade, em referência a vozes diferenciadas sócio-ideologicamente.
•
O trabalho de campo como uma realidade negociada.
Alguns dos representantes desta corrente, são: Dennis Tedlock, Paul Rabinow e Vincent Crapanzano. Se bem que a antropologia pós-moderna sensibilizou para problemas não antes estudados, mas ao mesmo tempo criticou o objectivo ingénuo, implica várias problemáticas sobre as quais é necessário pensar e reflectir. Uma das primeiras problemáticas levantadas por esta corrente é relativo ao relativismo mais absoluto. Sem relativismo não há antropologia, sem embargo é necessário para ir mais além, pois as culturas são marcos de significados autónomos incomensuráveis; é preciso fazer um uso crítico heurístico do relativismo, pois o uso dogmático do relativismo impossibilita a antropologia e a comparação intercultural. O uso dogmático do relativismo é perigoso politicamente pois mina a critica cultural dos fenómenos e pode terminar num niilismo
que
negue
a
capacidade
libertadora
e
transformadora
da
antropologia, só enfraqueceria a força e não a razão para terminar a opressão legitimada. A segunda problemática da antropologia pós-moderna é “vale tudo” de alguns aspectos do seu neoliberalista que pode levar a que tudo siga igual e que não se ita nenhum procedimento que garanta a verdade do que é afirmado, em definitivo que não se procure e critique o que realmente sucede numa sociedade; a alternativa é defender que “nada vale para explicar tudo”. Em terceiro pressuposto é cair numa filosofia ingénua de acção e discurso segundo o qual as chaves da vida cultural estariam no nível imediato do discurso do informante. Pelo contrário, para encontrar estas chaves é necessário situa-se numa posição de exterioridade explicativa -teórica e não só descritiva, assumindo os instrumentos de objectivação mental da acção social e dos discursos. Neste contexto o papel do antropólogo
é fundamental, pois sem a interpretação do antropólogo, sem um uso correcto da etnografia o leitor sente-se desconcertado, pois os dados não falam por si só. Em jeito de resumo, a antropologia pós-moderna defende estes principais
pilares
basilares:
a
realidade
é
sempre
interpretativa;
a
antropologia é uma interpretação de interpretações; critica as retóricas de autoridade clássica e defende um novo paradigma do trabalho de campo: etnografia multisituada.